Cada vez mais se vai reduzindo o
número dos Antigos Combatentes. N’ O Combatente da Estrela, na página da
necrologia, por vezes, surgem surpresas sobre os que terminaram a sua missão neste
planeta. Muitos deles, senão todos, foram parte importante de algum tempo
passado de confraternização, memorizando os tempos da guerra, mas também outros
melhores períodos das nossas vidas, como da infância, juventude, tempo da vida
escolar à profissional, as viagens, os de convívio fazedores de amizades, não
esquecendo os familiares. Já não são só os filhos, mas também os netos. Até que o prazo de validade humana termina
mais cedo ou permanece mais tardio para outros Camaradas.
É a lei insofismável da vida.
Esse diafragma que nos suporta mais ou menos tempo. O equador das nossas
vivências. Aquele que divide os dois “hemisférios” do nosso corpo humano,
embora não sendo esférico. Por um lado, o das memórias e do pensamento que nos
direciona para decisões em prol do companheirismo. Por outro, aquele que nos
traz o desconforto, o imprevisto, o fazedor de maleitas incontornáveis que se
vão agudizando. Muitas vezes parece que nos colocam repentinamente em órbitra, e
o nosso “corpo-planeta” perde o caminho a percorrer e vai-se desvanecendo.
Desde a existência do homem na
Terra, sempre houve guerras. Ainda umas não acabaram já outras foram emergindo
pelo território planetário.
Na última revista “O Combatente”,
edição 403, de março de 2023, o diretor, Joaquim Chito Rodrigues,
Tenente-General e Presidente da Liga dos Combatentes, no seu editorial, fala num
“tema controverso e fraturante sobre o conflito armado que opôs Portugal aos
chamados Movimentos que em Angola, Moçambique e Guiné lutaram pela
independência!”. Colocou o título – “Guerra Colonial, Guerra do Ultramar,
Guerra de África (1961-1975) ... ou Guerra de Libertação?” E desenvolveu o seu
artigo dizendo que “Vai-se ao ponto de se considerar que quem utiliza o termo
guerra do ultramar é politicamente de direita, quem utiliza o termo guerra
colonial é de esquerda! Alguns historiadores tentam mesmo encostar os
combatentes do ultramar politicamente, à extrema-direita”. Importante assinalar
que a designação oficial de Províncias Ultramarinas durou legal e
constitucionalmente 102 anos (de 1838 a 1920 e de 1951 a 1974); e a designação de
colónias e de império colonial durou apenas 31 anos (de 1920 a 1951, dez anos
antes da guerra do ultramar, embora houvesse Ministro das Colónias depois de
1911).
Na Liga dos Combatentes usamos
genericamente a terminologia ultramar e guerra do ultramar e por vezes face à
análise do universo envolvente acrescentamos ou guerra colonial se assim lhe
quiserem chamar!... “Somos inclusivos – diz Chito Rodrigues. Hoje mantemos
relações institucionais com as Associações de Combatentes dos países que
fizeram as guerras que denominam ‘Guerras de Libertação’”.
No dia 1 de abril, realizou-se o
“Dia do Combatente” e o 105º Aniversário da Batalha de La Lys.
Sobre a secretária do meu
escritório, fui encontrar o livrinho de 84 páginas, ano 2012, numa 4ª edição,
de Jaime Froufe Andrade, da Coleção Memória Perecível, da Associação dos
Jornalistas e Homens de Letras do Porto.
O seu título: “Não Sabes Como Vais Morrer”. São 7 mais 1 histórias de
guerra deste autor, e regresso atribulado no Vera Cruz. Da página 67, transcrevo parte da narração do
alferes miliciano Dinis Martins: “Depois da noite em claro, fui até ao bar dos
oficiais. Encontrei-o vazio. Não tardou a entrar lá um homem alto, magro,
vestido de branco. Era o Comandante do Vera Cruz. Ofereci-lhe a minha
mesa e falei-lhe do susto. Lembro-me de ele comentar que poderia ter sido a
maior tragédia desde que Portugal se lançou nos Descobrimentos. Comentou ainda
que, se tivesse surgido uma terceira vaga, a proa não conseguiria recuperar, e
o Vera Cruz mergulharia no oceano para sempre. Dito isto caímos os dois
em silêncio”.
Não será demais recordar a
primeira parte de um artigo do politólogo, Raul de Almeida, inserido no Jornal
Económico, de 07-04-2021, sobre Os Combatentes do Ultramar:
Por todo o mundo, e por muitos
pontos de Portugal, há monumentos e toponímia em homenagem aos diferentes
combatentes, que em diferentes guerras deram o melhor de si pela pátria, tantas
vezes a própria vida. O fenómeno da guerra defensiva liga-se ao longo dos
tempos a uma forte ideia de patriotismo. O soldado é por natureza alguém pronto
a lutar e morrer pela pátria. Tal condição, independente de ser ou não
voluntário, é premissa de coragem e heroicidade.
Os Combatentes portugueses da
Guerra do Ultramar, nas suas diferentes frentes, foram homens de enorme coragem
e heroicidade. Com risco da vida, a maior parte das vezes distantes das suas
famílias, enfrentaram anos da sua vida à defesa de Portugal, que à altura era
do Minho a Timor. Aos combatentes não cabe a decisão da guerra ou das
fronteiras da nação, apenas o cumprimento da missão que esta implica.
Portugal tem uma dívida de
gratidão com todos os combatentes na sua longa história. De Ourique ao
Ultramar, a História e as diferentes dimensões de Portugal foram sempre
garantidas por combatentes valorosos. As diferentes mudanças territoriais, as
poucas derrotas, foram sempre fruto de decisões políticas, nunca podendo ser
imputada ao soldado português.
João de Jesus Nunes
(In “O Combatente da Estrela”, nº
131-JUL/2023)
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