19 de outubro de 2022

ELEIÇÕES E CONTRADIÇÕES


 

“O mundo pula e avança como bola colorida entre as mãos de uma criança” – assim termina a Pedra Filosofal de Manuel Freire. Mas também inicia com as letras “Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida, tão concreta e definida como outra coisa qualquer”.

Este mundo está cada vez mais nas mãos de muitos senhores que fazem deste Planeta uma bola de farrapos, que se vai desfazendo com tantos pontapés sem sentido, retirando-lhe todos os cambiantes do bem-estar de todos os humanos. Aos outros senhores, que deveriam ser respeitados, que cumprem os acordos internacionais em prol da Casa Comum, já não lhes dão ouvidos, não passam cavaco, embirram como crianças quando lhes retiram a bola colorida.

Que mundo este sem sentido da vida! Mas, mesmo assim, existe o sonho que é uma constante da vida. Estamos atravessando um longo período que, não obstante uma pandemia ainda não terminada, uns quantos pensantes, julgando-se iluminados, são banhados no seu sonho que os irá conduzir para uma tremenda escuridão.

E neste avançar do mundo, repleto de boas intenções para uns, mas nas contradições de outros, assim vão surgindo ledos e tristes dias.

As últimas semanas foram repletas de acontecimentos se bem que relevantes também preocupantes. Faço referência, por exemplo, às eleições em Itália avançando para a extrema-direita na cena política europeia. Isto depois das vitórias alcançadas na Hungria, na Polónia e na Suécia, para além dos avanços ocorridos em França.

Pois é, já estávamos esquecidos do lema salazarista de “Deus, Pátria e Família”, quando surge agora o mesmo de Benito Mussolini, da terceira maior economia do euro e a segunda potência industrial da União Europeia.

Esperemos agora que, no Brasil, Lula da Silva, apesar de algumas contradições, possa levar de vencida, na segunda volta, em 30 de outubro, o ultra direitista Jair Bolsonaro.

Na Guerra da Ucrânia têm surgido importantes desenvolvimentos, quer no terreno quer nos bastidores. A relevância no terreno vai para as vitórias das forças ucranianas com o registo de significativos avanços, recuperando perto de 5.500 quilómetros quadrados.  Os invasores russos mostram já o seu grande nervosismo em face da humilhação provocada por estas vitórias ucranianas.

Depois, as muitas contradições entre responsáveis da Igreja Católica no encobrimento dos casos de pedofilia. Não fosse a persistência dos denunciantes e vítimas deste contexto, em casos que, muitos deles, já prescreveram, estes homens do “divino” ficavam no segredo dos deuses, muitos dos quais sem punição. Lamentáveis os encobrimentos desses desvios sexuais por homens da Igreja, que deveriam ser os primeiros a dar o exemplo, como o Bispo de Leiria-Fátima, D. José Ornelas, como dantes já haviam sido o Patriarca de Lisboa, Cardeal D. Manuel Clemente. E nesta envolvente de casos até o bispo de Timor, Prémio Nobel da Paz, viria a ser apanhado na rede, há já bastante tempo, com o ar de espanto dos portugueses perante D. Ximenes Belo.

E, para completar o ramalhete de casos deploráveis nestas circunstâncias, faltavam as palavras de agradar a Deus e ao Diabo, do Presidente da República, a tentar deitar água na fervura quando se referiu que “Haver 400 casos não me parece que seja particularmente elevado porque noutros países e com horizontes mais pequenos houve milhares de casos”. Os 424 testemunhos foram recolhidos pela designada Comissão Independente para Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa, uma estrutura constituída por decisão da Conferência Episcopal Portuguesa e coordenada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht.

Face à avalanche de críticas sobre as palavras do Presidente da República, este viu-se constrangido a pedir desculpa: “A minha intenção não foi ofender as vítimas, se ofendi, peço desculpa”.

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In quinzenário “O Olhanense”, de 15-10-2022)

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