14 de dezembro de 2024

CAMINHAMOS PARA O FINAL DE 2024 ENTRE DECISÕES, CONFUSÕES E ILUSÕES


 Mais uma etapa das nossas vidas se vai cumprindo e, felizmente, ainda nos podemos contar entre os vivos. O que ocorreu no início deste ano, embora algo que teve o seu prelúdio, é vasto, e tudo o que foi semeado, entre caminhos pedregosos ou em terras férteis, agora encontra seu Ómega.

A invasão da Ucrânia pela Rússia continua tendo-se iniciado em 24 de fevereiro de 2022. Nesse dia, a Rússia lançou uma ofensiva militar em larga escala contra a Ucrânia, após meses de tensões crescentes e uma escalada de movimentações militares ao longo da fronteira. A invasão foi precedida por anos de conflito na região de Donbass, onde separatistas pró-Rússia, apoiados pelo Kremelin, lutavam contra o governo ucraniano desde 2014, após a anexação da Crimeia pela Rússia. A invasão causou grandes crises humanitárias, destruição em várias cidades e milhões de deslocados, além de ampla reação internacional, com sanções económicas contra a Rússia e apoio militar e humanitário à Ucrânia.

O conflito entre Israel e o Hamas, o grupo militante que controla a Faixa de Gaza, escalou quando, em 7 de outubro de 2023, o Hamas lançou um ataque surpresa contra Israel, resultando em centenas de vítimas israelitas e a tomada de reféns. O ataque que incluiu disparos de foguetes e invasões em várias cidades israelitas, marcou uma das ações mais significativas e violentas nos últimos anos e aumentou a tensão já existente na região. Israel reagiu ao ataque com uma série de operações militares contra alvos do Hamas em Gaza, com a intensificação do conflito resultando em centenas de mortos e feridos de ambos os lados. A tomada de reféns israelitas pelo Hamas complicou ainda mais a situação, com negociações internacionais e esforços de mediação visando a libertação dos reféns e uma eventual trégua. Mantém-se ainda ativo. 

As catástrofes no planeta provenientes das alterações climáticas têm sido cada vez mais acentuadas e devastadoras. A Austrália tem enfrentado eventos climáticos extremos significativos em 2024, com incêndios, ondas de calor e tempestades intensificadas por mudanças climáticas. Um relatório do Bureau de Meteorologia e CSIRO destacou que os oceanos australianos estão aquecendo rapidamente, influenciando padrões meteorológicos, como chuvas intensas, e aumento do nível do mar, o que causa danos em áreas costeiras e urbanas suscetíveis de inundações. Além disso, a seca e a redução de chuvas no sudeste e sudoeste australianos elevam o risco de incêndios e comprometem o armazenamento de água em várias regiões, afetando a agricultura e o abastecimento urbano. Este aumento na frequência e severidade de eventos meteorológicos preocupa especialistas, que alertam para um futuro com mais extremos se as emissões de gases de efeito estufa não forem reduzidas. Esses fatores contribuem para um ambiente de desafios constantes para infraestruturas, biodiversidade e segurança humana em todo o país.

As cheias em Valência, que começaram em 29 de outubro de 2024, foram provocadas por fortes tempestades e uma queda repentina de temperatura conhecida como gota fria, resultando em precipitações intensas e devastadoras. Foram mais de 200 vítimas mortais e muitos desaparecidos, tanto na região autónoma da Comunidade Valenciana, no leste de Espanha, assim como na região de Castela La Mancha, numa zona vizinha.  As inundações destruíram infraestruturas, deixaram moradores sem eletricidade e interromperam serviço de transporte. Foi um evento climático descrito como o mais severo do século. 

Temos agora a COP 29. São 30 anos de avisos, promessas e cimeiras. As cimeiras das Nações Unidas sobre o clima já se realizaram 28 vezes, mas emissões de gases com efeito de estufa continuam a aumentar e o ano passado foi o mais quente já registado, com 2024 a caminho de ser o primeiro a ultrapassar +1,5ºC em relação à era pré-industrial. Esta é a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2024 ou Conferência das Partes da UNFCCC, mais comumente conhecida como COP29, sendo a 29ª Conferência sobre Mudanças Climáticas. É realizada em Baku, Azerbaijão, de 11 a 22 de novembro de 2024. É certo que a sombra da eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, disposto a negar as alterações climáticas e refazer uma economia baseada em combustíveis fósseis e no protecionismo, paira sobre a conferência. Isto já aconteceu no COP22, em Marraquexe, em 2016, quando Donald Trump foi eleito Presidente pela primeira vez.

Entretanto, a eleição de Donald Trump para um novo mandato pode trazer várias preocupações tanto nos Estados Unidos quanto internacionalmente. Aqui estão alguns dos principais perigos apontados pelos analistas: 1-Relações Internacionais: A vitória de Trump pode afetar as relações dos EUA com a União Europeia, especialmente em questões de comércio e segurança. Trump tem criticado repetidamente o bloco europeu e ameaçado acabar com os laços atuais ente a UE e os EUA. 2 - Ajuda à Ucrânia: Há preocupações de que Trump possa reduzir ou cortar o fornecimento de armas e assistência financeira à Ucrânia, o que poderia enfraquecer a resistência ucraniana contra a invasão russa. 3 – Isolacionismo: Trump defende uma política de isolacionismo, o que significa que os EUA poderiam reduzir o seu envolvimento em alianças internacionais como a NATO, deixando os aliados europeus mais vulneráveis. 4 – Impunidade e Justiça: A eleição de Trump, mesmo após ser condenado em processos judiciais, levanta questões sobre a impunidade e pode servir de alerta para outros países sobre a importância de manter a integridade do sistema judicial. 5 – Impacto Económico: A vitória de Trump pode causar incertezas económicas, afetando mercados financeiros e setores específicos como energias renováveis e farmacêuticas, enquanto setores como criptomoedas e petróleo se podem beneficiar.

Voltamo-nos agora para o nosso País e também as coisas não estão famosas. O atual governo de Portugal liderado por Luis Montenegro, tomou posse em 2 de abril de 2024. É o XXIV Governo Constitucional de Portugal e foi nomeado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, com base nos resultados das eleições legislativas de 2024. É uma coligação liderada pela Aliança Democrática (AD), que inclui o Partido Social Democrata (PSD), o Centro Democrático e Social-Partido Popular (CDS-PP) e o Partido Popular Monárquico (PPM).

Os distúrbios em Lisboa começaram na madrugada de segunda-feira, 22 de outubro de 2024, após a morte de Odair Moniz que foi baleado pela PSP na Cova da Moura. Desde então houve várias noites consecutiva de tumultos em diferentes bairros da Grande Lisboa. A ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, envolveu-se num imbróglio em afirmações sobre o direito à greve na polícia, fazendo depois marcha atrás após “infelicidade”. 

O problema maior está com a ministra da Saúde, Ana Paula Martins, com alegados casos de 11 vítimas mortais associadas aos atrasos no atendimento de emergência médica, face à greve dos técnicos do INEM. 

Mas para não ser tudo mau, no dia 11 de novembro, dia de São Martinho, começou a nova edição da Web Summit Lisboa, 16ª., com cerca de 2750 startups presentes e dezenas de oradores na FIL, no Parque das Nações. O tema deste ano é “Onde o futuro vai nascer” e terá como foco temas como a Inteligência Artificial, as alterações climáticas, entre outros.

Sobre a Covilhã quero referir alguns aniversários que se comemoram. Este espaço foi, excecionalmente, alongado em final de ano: os 50 anos que assinalam o Teatro das Beiras neste percurso cultural; os 70 anos do CCD Oriental de São Martinho; o centenário da Casa da Covilhã em Lisboa; e os 125 anos da fundação da Conferência de São Vicente de Paulo da Paróquia de Santa Maria.

Como este é o último número deste ano, formulo os melhores votos de um Feliz Natal aos prezados Camaradas Antigos Combatentes deste Núcleo e suas Famílias, e a todos os Associados, Leitores e Obreiros deste Jornal, assim como um Novo Ano repleto das maiores venturas.


João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Combatente da Estrela”, nº. 137, DEZ/2024)


CONTE-NOS A SUA HISTÓRIA RUI LUCIANO MENDES PINTO

 

Neste último número d’ “O Combatente da Estrela”, do ano 2024, trazemos ao conhecimento dos prezados leitores uma figura amplamente conhecida desta cidade laneira, hoje marcada por forte ambiente universitário, e que nasceu na Covilhã em 5 de novembro de 1943 – o Rui Pinto.
Como muita gente do seu tempo, iniciou a sua atividade profissional na indústria de lanifícios, onde foi tecelão, até ser chamado para cumprir o serviço militar obrigatório.
Tendo ainda frequentado a Escola Industrial e Comercial Campos Melo da Covilhã, como amante da música, foi, nas horas livres, vocalista no conjunto “Manchester”.
Chegado o momento de ter de entrar nas fileiras do Exército, fez a recruta no CICA3 em Elvas, com início em 19 de outubro de 1964, ou seja, há sessenta anos. Seguiu depois para o RI 16, no Porto, onde tirou a adaptação à especialidade de condutor auto. Posteriormente o seu destino foi o RI 2, em Abrantes, já com a sina da sua mobilização para Angola. Veio a embarcar no Vera Cruz em 20 de abril de 1965 para desembarcar em Luanda em 8 de maio.
Em Angola, depois de chegado ao Grafanil, foi destacado para a Fazenda Maria Fernanda, na Zona de Zemba, uma das mais perigosas da altura. Daqui foi para Cambambe e depois Ambriz, já perto de Luanda, onde aqui viria aguardar o seu regresso à Metrópole, embarcando novamente no Vera Cruz, em Luanda, no dia 22 de maio de 1967, tendo desembarcado em Lisboa no dia 3 de junho.
Felizmente, no seu percurso em terras angolanas na guerra subversiva, embora o Rui Pinto andasse com uma GMC para rebentamento de minas, não teve qualquer situação problemática. Conta-nos que, em dado percurso, onde há já muito tempo não tinha havido conhecimento de agitações do inimigo, mas havia que ter a certeza de que as estradas não se encontravam minadas, o Comandante da Companhia deu-lhe ordens para fazer esse percurso, eventualmente perigoso. O Rui Pinto, coberto de medo, começou a chorar e o Comandante, vendo esta conduta, colocou-se ao seu lado a fim de lhe dar ânimo, com estas palavras: “Vamos, Rui, se morreres também morro eu!” E assim se cumpriu a determinação do Comandante, sem que houvesse qualquer problema de rebentamento de minas.
O condutor Rui Pinto era ainda o responsável por colocar o gerador de luz a trabalhar e bombear a água para todo o acampamento. 
Mas a parte interessante e que deixou Rui Pinto muito orgulhoso foi o louvor que se insere abaixo, do Comandante da Companhia, sem contar com outros que lhe foram atribuídos, porquanto continuou a dedicar-se à música, mesmo em “teatro de guerra”, junto dos seus camaradas. Da sua caderneta militar extraímos o seguinte: “Louvado pelo Comandante da Companhia de Caçadores 768, Batalhão 770, porque fazendo parte do conjunto musical do Batalhão de Caçadores 770 em acumulação  com as funções normais de serviço, contribuiu para a melhoria da moral do pessoal não só do Batalhão mas também de outras unidades, integrado como último recurso * no conjunto musical há cerca de 5 meses e de salientar a sua actividade entusiasta e muito dedicado sem a qual aquele conjunto teria de ser extinto (Ordem de Serviço nº. 83).”
*Esta integração, substituindo o anterior baterista, deveu-se ao facto de este ter desertado, continuando o Rui Pinto como vocalista e simultaneamente baterista.
Rui Luciano Mendes Pinto, cumprido o serviço militar obrigatório, veio a integrar os órgãos sociais deste Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes e passou a exercer nova atividade profissional na área das vendas, tendo sido vendedor em várias empresas, como a Tricogom, Lanofabril com os Fios Tricot e, por último, a Delta Cafés.
João de Jesus Nunes
(In “O Combatente da Estrela”, nº. 137-DEZ/2024)

11 de dezembro de 2024

DEDICAÇÃO À ESCRITA HÁ 60 ANOS

 


Neste milénio em que vivemos no século XXI, quase alcançando duas décadas e meia do mesmo, estamos em mais um final de ano, acrescentando muito para contar no que vai ficar para a história. Se algo há de positivo, paradoxalmente temos muito de desconfortável para as nossas vidas.
Sempre assim foi. Desde os tempos primitivos. Os humanos tendem a não se entender. Muitas e longas guerras já existiram neste Planeta. No entanto, a esperança é a última coisa a desaparecer, como sói dizer-se. 
Escrevo esta crónica num domingo de frio cortante. Na véspera do mesmo participei num Jantar de Natal, para Escritores e Músicos da Covilhã, num restaurante desta Cidade, onde tive o prazer de confraternizar com muitos outros do contexto literário e jornalístico onde nos inserimos, para além de outros de âmbito musical, e não só, onde a cultura manteve o vínculo do interesse que a todos se unia.
Em seis décadas foi a primeira vez que participei num evento desta natureza à volta de uma mesa onde os prazeres gastronómicos com os da confraternização cultural, num contexto de interesses do mesmo âmbito se evidenciaram na avidez de prosseguir em prol da cultura citadina e não só.
Lembrados que foram alguns dos que já partiram deste grupo literário e jornalístico, um ou outro soltaria da sua voz aquele “Grito do Ipiranga” em momentos do peso da poesia sentida. A longevidade daquele que, embora doente desprezou esse seu estado mórbido e declamou vibrantemente uma poesia de Alexandre O’Neill com que terminaria este excelente convívio foi a cereja em cima do bolo.
Também eu me senti orgulhoso, no sossego dos meus pensamentos, porquanto sabia que estava ali, sem que o grupo soubesse ou adivinhasse, a ter dedicado sessenta anos à escrita, cuja “efeméride” deste ano se iniciou em 14 de novembro de 1964 no semanário Notícias da Covilhã (NC). Neste periódico escrevi 397 crónicas e artigos até 15 de novembro de 2018, encerrando uma colaboração de 54 anos. 
Mas é então que encontro lugar para transmitir muito do que escrevi. Até hoje, somam-se 866 crónicas em vários periódicos, alguns já desaparecidos. Destaco o semanário Jornal Fórum Covilhã (FC), composto por jornalistas formados na Universidade da Beira Interior. Nele, publiquei 146 crónicas entre 10/09/2013 a 27/11/2024, ou seja, em 11 anos. Acresce que agora com a Rádio Jornal Fórum tornou-se um jornal de grande atratividade.
Mas um carinho muito especial vai para o quinzenário algarvio O Olhanense, o segundo onde mais colaboro em termos de crónicas, num total de 103 exclusivas, mas que, adicionadas de mais 262 que também publicava no NC e FC, num período em que a minha vida profissional não me permitia escrever em exclusivo em tantos jornais, é o periódico por quem tenho muito respeito e simpatia. Nele colaboro ininterruptamente há 30 anos, quinzenalmente, desde 15-06-1994.
Penso, por isso, que sou o cronista há mais tempo a escrever de âmbito jornalístico, na Covilhã e talvez na Região. 
Por vezes, de vários pontos do País chega-me a surpresa de que já me conhecem. À minha pergunta de qual a origem, indicam-me o Jornal.
Ao longo de 60 anos, publiquei 866 crónicas exclusivas, com 439 textos republicados em outros periódicos. O total de 1 305 textos foi publicado em 34 jornais e revistas, com destaque para: Notícias da Covilhã, Jornal do Fundão, Gazeta do Interior, Record, O Olhanense, Tribuna Desportiva, Reconquista, A Guarda, O Leão da Serra, Voz do Trabalho, Sporting, Diário XXI, O Interior, Já Agora, Notícias de Gouveia, Porta da Estrela, Essencial Seguros, Notícias Magazine, Jornal Fórum Covilhã, Boletim Português da Sociedade de São Vicente de Paulo, Selfieseguros, O Combatente da Estrela. Noutro periódicos dispersos ou revistas únicas: Fronteiros da Beira (RI 12 – Guarda), em 1971; Ecos da APAE; Associação de Futebol de Castelo Branco – Covilhã Desportiva – I Torneio Quadrangular Cidade da Covilhã, em 1995; Boletim Informativo nº. 1 (Casa da Covilhã, em Lisboa), em 2014; Maisfutebol (digital), em 2014; Euronotícia (Europeia de Seguros); WinInforma – Revista de Mediadores (Europeia/Winterthur), em 1996; Verde e Branco – Sporting Clube da Covilhã – 2022; Velhas Glórias do Sporting Clube da Covilhã num encontro de amizade no Futebol Clube Estrela de Unhais da Serra; Vida Económica (Separada de Seguros); Liberty em Acção; Cinco Quinas.
No entanto, a veia para a escrita foi ainda para a publicação de 12 obras, algumas delas por solicitação interessada de entidades: “APAE – Associação dos Antigos Professores, Alunos e Empregados da Escola Campos Melo da Covilhã – 9 Anos de Actividades Culturais ao Serviço da Cidade e do Concelho – 1983 -1992”; “Subsídios para a História do Sporting Clube da Covilhã1992”; “Figuras e Factos do Sporting Clube da Covilhã – 1993”; “Sporting Clube da Covilhã – Passado e Presente- 1998”; “A Conferência de S. Vicente de Paulo na Paróquia de Nossa Senhora da Conceição da Covilhã no seu Centenário – 19-03-1903 – 19-03-2003)”; “Vida e Obra dos Bombeiros Voluntários da Covilhã (em dois volumes): I – Ontem e Hoje, II – Vultos da Sua História – 2004”; “Sporting Clube da Covilhã na Taça de Portugal – Cinquentenário da sua Participação na Final – 2007”; “Ernesto Cruz – Um Visionário da Indústria, Um Industrial do seu Tempo – 2010”; “Breve Resenha do Centro de Recreio Popular Estrela Desportiva de São Pedro – 1944 – 1972, no ano 2015”; “O Documento Antigo – Uma Outra Forma de Ver os Seguros – 2018”; “Da Montanha ao Vale – As Viagens de Um Grupo de Tertulianos – 2022”; “Recordar é Viver – 2022”.
Por último, porquanto este detalhe certamente já estará a ser objeto de enfado para os prezados Leitores, informo que foram feitas 61 referências às minhas obras em algumas das várias publicações atrás mencionadas, e mais as seguintes: O Jogo (1992), A Bola (1992), El Adelanto (Salamanca) – 1993, Correio da Manhã (1993, Diário de Coimbra (1993), Agenda Cultural da Covilhã – Edição CMC (1999), Florinda (1999), Boletim Municipal da CMC, Ubi et Orbi – 2010, Revista do Jornal do Fundão (2010), Kaminhos (digital) – 2010.
Com estas palavras, desejo a todos os Prezados Leitores, suas famílias e a todos os obreiros deste jornal, um Santo Natal e um Próspero Ano Novo.
João de Jesus Nunes
jjnunes6200@gmail.com
(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 11-12-2024)

4 de dezembro de 2024

HÁ 52 ANOS VIVI E TRABALHEI NO SOITO

 

Corria o ano de 1972. Tinha acabado de terminar o serviço militar obrigatório no RI 12, na Guarda, trabalhava na edilidade covilhanense. Apesar de ter ficado em 1º lugar num concurso para promoção a categoria superior, enfrentei apenas barreiras e desilusões. Naquele tempo, o funcionalismo público ficava muito aquém do setor privado em oportunidades e condições de trabalho. Os serviços de saúde eram inexistentes. Mesmo assim, casei e já esperava o segundo filho, o que me levou a buscar novos horizontes profissionais. 

Face a uma confusão, acabo por encontrar emprego no Sabugal, pensava eu. Pergunto onde fica a empresa Refrigerantes Cristalina, Lda. Dizem-me que é no Soito, a cerca de 18 Km. Digo ao colega e amigo que me deu boleia da Covilhã para o Sabugal:

 - Volta para trás, s.f.f. Resposta imediata do Fernando Paiva: - Se já viemos até aqui, vamos lá! É a ele que lhe devo ter mudado a minha vida. No Soito, apresentando os meus argumentos ao empresário João Oliveira, acabei por imediatamente ficar ali. O salário mais que duplicava o que anteriormente auferia.

Era agora necessário obter a carta de condução, pois de duas vezes que vim da Covilhã para o Soito, de comboio e autocarro, com transbordos, acabava por chegar tarde ao emprego. 

Encontro no Sabugal a Escola de Condução do meu conterrâneo António Sardinha Mendes da Paula que tinha a esposa, professora primária, natural de Rapoula do Côa. Obtenho a carta de condução fazendo exame em Coimbra.

Mas começam a surgir-me convites de participações em exames que fizera, de acesso a empregos para os quais tinha concorrido. Naquela altura, só depois do serviço militar cumprido se conseguia um emprego estável. Chamaram-me para o Banco Nacional Ultramarino em Setúbal, após ter obtido “Bom” no exame realizado na sede do Banco em Lisboa. Porém, o vencimento mesmo assim inferior, a longa distância, e o nascimento do meu filho levaram-me a desistir.

Mas a minha vida no Soito, nos anos 70, contrastava com os hábitos urbanos que eu conhecia. O Soito daquela época não tinha as condições atuais. Era uma aldeia simples, com fábricas de confeções, gelados e refrigerantes, mas com infraestrutura limitada a única rua que terminava em casas de granito, muito degradadas. Dois ou três cafés. Um colégio particular servia em grande parte a população jovem que distava mais de dúzia e meia de Km da sede do concelho – o Sabugal, onde a empresa de camionagem Vª Monteiro & Irmão, Lda, já centenária, ainda desenvolve a sua atividade.

Acordar ao tilintar e mugir dos bois, e desviar-me da bosta que os animais deixavam sobre aquela estrada de alcatrão até à fábrica, era algo que me custava a habituar, enquanto via algumas mulheres a caminho da ribeira para lavaram a roupa.

A carrada de lenha que havia adquirido para a lareira da casa acabada de construir, de emigrantes, que aluguei, ali ficou quase toda na garagem. Um feliz convite para chefiar os escritórios da Companhia Europeia de Seguros na Covilhã chegou por via de um telefonema, num feliz dia, para a fábrica onde trabalhava. Aceitei o convite e iniciei um novo capítulo profissional.

Não valeram as tentativas de persuasão de João Oliveira, muito voltado para os Cursos de Cristandade, de que também ali tinha um médico residente, dentista que fazia clínica geral, e um posto de correios. Assim como a sugestão que já nos havia colocado, em um número restrito de empregados, para podermos vir a fazer parte da sociedade que estava em formação na Guarda, uma fábrica de iogurtes, com a qual o filho Fernando Oliveira, então a completar o curso de Economia, não concordava, me demoveram da intenção de seguir novo rumo. Tinha eu então adquirido um Opel Kadett usado com que já me podia deslocar, mas a Seguradora entregou-me também a parte comercial da empresa nos distritos de Castelo Branco e Guarda, e, confiou-me uma viatura nova – um Simca 1100, que trouxe de Lisboa, após ter completado uma formação.

E assim se transformou uma vida que iria desenvolver-se, em grande parte, na atividade no Sabugal, a partir de junho de 1973. Aqui dei ensejo a muitas amizades. De uma vida de sedentário quase passou a nómada, tais foram as várias moradas que tive que posteriormente conseguir.

Em agosto desse ano de 1973 estava já eu com um grupo de clientes e um agente a tomar umas cervejas à noite, na Sacor do Sabugal, antes de regressar à Covilhã. Ouvia na televisão, ainda a preto e branco, o ministro Veiga Simão a anunciar a reforma do ensino. E qual não foi a minha alegria ao ouvir a criação de vários Institutos Politécnicos, anunciando o primeiro na Covilhã, que hoje é a Universidade da Beira Interior, logo seguido de outros. De regresso à minha cidade, e com a responsabilidade comercial nos referidos distritos, bem como a gestão dum escritório afeto aos mesmos, foi um enriquecimento de conhecimentos, de amizades, de entusiasmo no que fazia, cabendo-me a formação de agentes ainda limitados a contratos com as condições gerais das seguradoras uniformes onde a liberalização só viria a surgir após a Revolução dos Cravos. Os seguros obrigatórios ainda eram inexistes, o único era o de acidentes de trabalho. Viria a surgir o primeiro seguro obrigatório de Caçadores e depois o do ramo Automóveis, sendo que ainda não havia seguros multirriscos de habitação.

Todas as facetas duma nova vida que se prolongaria por mais de quatro décadas, levaram-me a muitos recantos do país numa viragem que já não se coadunava com o mugir dos bois do Soito, mas projetaram-me também para viagens ao estrangeiro.

Embora a vida tenha seguido outro rumo, guardo no coração as amizades e aprendizagens que construí no Soito. Este capítulo foi essencial para moldar a minha trajetória. No Sabugal não posso esquecer as boas gentes sabugalenses com que viria a gerar negócios e amizades verdadeiras, tais como Alcino Monteiro, Raul e Luís Rastreiro, da empresa de camionagem já referida, António José Natário e outros. 


João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “Cinco Quinas”, de dezembro de 2024)


27 de novembro de 2024

“DÁ-ME A NAVALHA SE NÃO FICAS SÓ”

 

Creio ser, nesta altura, quem escreve regularmente nos jornais há mais tempo nesta cidade, conhecida tanto pelo seu passado laneiro quanto pelo ambiente universitário atual, desde meados da década de sessenta do século XX. Entre cerca de trinta jornais e revistas distribuídos pela Covilhã, região beirã e outras partes do país, foi aqui que as digitalizações dos meus dedos, antes em máquinas de escrever e agora em computadores, transformaram inspiração e estudos em publicações impressas. Muitos desses jornais e revistas, vale notar, já não existem. 

E, porque estamos no final do ano e na aproximação da época natalícia, já se começam a fazer os arranjos alusivos com iluminações em muitas cidades e vilas de Portugal. A Covilhã não foge à regra. Em tempos, essas iluminações eram responsabilidade direta das edilidades, sendo realizadas, no caso específico da Covilhã, pelos antigos Serviços Municipalizados, sob a direção de Alexandre Galvão Aibéo, um homem de grande engenho. 

Almoços e jantares de Natal com grupos de amigos em coletividades, instituições ou de modo particular, já começaram a ser agendados, sendo que os da família têm um tratamento especial. Lá estarei na habitual “Couvada”, num desses eventos organizados no âmbito da “velha guarda” profissional e não só, com as memórias daqueles que, felizmente, ainda se podem reunir. Foi num desses ambientes, onde continuamos a partilhar nossos pontos de vista, que me foi “imposto” contar a história da atividade profissional que todos exercemos durante longos anos. Assim nasceu uma obra, envolvendo paradoxalmente aqueles que terminaram as suas carreiras e os que ainda a exercem, num denominador comum enriquecedor de cultura.

Para o Jornal Fórum Covilhã, trazemos, em ambiente descontraído, pedaços romanescos que dão substância à obra * na qual esses mesmos foram inseridos.

“O Zé do Megane interrompe e diz: - Meus amigos, há pouco falámos do ‘prémio’ que vinha do latim. A propósito, lembro-me de quando eu era menino e me preparava para fazer a primeira comunhão em Freixo de Espada à Cinta, onde vivia com os meus avós. Naquela época, a missa ainda era em latim, com o padre de costas voltadas para os fiéis. O sacristão precisava responder em latim durante a missa, e frequentemente alguns rapazes, já crescidos, faziam o papel do sacristão, ajudando o padre na Celebração Eucarística. 

Um desses rapazes tinha um canivete que usava na agricultura e brincava com ele entre os colegas, ainda na sacristia, antes de começar a missa.

O padre já o havia alertado para guardar o canivete, que era grande e, de certo modo, perigoso.  Naquele dia o rapaz ajudante acabou ficando sem a navalha, que o padre lhe retirou e guardou no bolso da batina preta, cheia de botões de cima a baixo, como se usava então.

A missa começa e quando o sacerdote dizia ‘Dominus vobiscum’ (‘O Senhor esteja convosco’), o sacristão ou o ajudante respondia ‘Et cum spiritu tuo’ (‘E com o teu espírito’). Era um sacramental antigo, uma saudação tradicional do clero no Rito Romano. Naquela época, os fiéis quase não respondiam a nada, e grande parte da missa era recitada apenas pelo padre e pelo sacristão, em latim. O rapaz estava distraído, pensativo: ‘O senhor Prior ficou-me com a navalha, raio do padre que me ficou com a navalha...’  

Um dos fiéis a seu lado bateu-lhe no ombro, lembrando-o de responder ao sacerdote, que já havia olhado para trás. Nessa altura, o padre repetiu ‘Dominus vobiscum!’  O rapaz, ainda a pensar na navalha, respondeu, em alta voz: ‘Et cum spiritu tuó, dá-me a navalha se não ficas só!’”


*In “O Documento Antigo – Uma outra forma de ver os Seguros”, com adaptação.


João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 27-11-2024)


19 de novembro de 2024

O LEITOR MAIS ANTIGO DA BIBLIOTECA MUNICIPAL DA COVILHÃ TAMBÉM LÊ “O OLHANENSE”

 

Entrei na Biblioteca Municipal para consultar uma obra, sem deixar de lado a curiosidade de ver a estante onde estão catalogados alguns dos meus primeiros livros que escrevi. Foi então que encontrei um amigo e companheiro de biblioteca dos velhos tempos, atento à leitura do jornal “O Olhanense”.

Sucedeu um avivar de memórias daqueles tempos, ainda na antiga Biblioteca Municipal, situada perto do Jardim Municipal. E não é que, palavra puxa palavra, ele me autoriza a fazer uma entrevista para este quinzenário, aproveitando a oportunidade para destacar uma figura simples, mas dedicada à leitura há mais de sete décadas?

Francisco Pereira de Sousa, natural de Caria, no concelho de Belmonte, mudou-se para a Covilhã com seus pais ainda em 1940, quando era criança (nasceu no dia 2 de setembro de 1937). Radicado na cidade desde então, aqui construiu a sua vida e segue ativo aos 87 anos. Tem três filhos.

Numa altura em que o ensino básico era quase a única opção disponível e o secundário praticamente inexistente na cidade, com dificuldades de acesso ao liceu ou à Escola Industrial, Francisco Sousa começou a trabalhar aos 12 anos no comércio local. Iniciou-se como empregado de balcão, tornando-se posteriormente encarregado de uma loja durante 20 anos. Mais tarde, atuou como vendedor ao longo de 37 anos, passando a trabalhar por conta própria com um armazém de tecidos, malhas e miudezas. 

Vivendo perto da antiga Biblioteca Municipal, encontrou nela o antídoto para a falta de entretenimento no dia a dia. Naquela época, o futebol aos domingos supria parte dessa carência para muitos, enquanto outros recorriam às tabernas ou passavam algum tempo nos Centros de Recreio Popular então existentes.

Quis o destino que sua atual morada se situasse também perto da nova Biblioteca Municipal, na parte moderna da cidade, onde deu continuidade ao seu gosto pela leitura, não só de livros, mas também de jornais. Foi assim que aconteceu com “O Olhanense”.

- “Olhe. Sr. Nunes, ainda me recordo de ver jogar pelo Olhanense, no Santos Pinto, na Covilhã, com o Sporting da Covilhã, de que era sócio, nomes como o Reina, Luciano, Madeira, Cava e o Parra, ou de ouvir falar deles”.

Pois é, os Leões da Serra jogaram na I Divisão com o Sp. Olhanense, nas épocas 1948/1949, 1949/50, 1950/51 e 1961/62, em tempos que já lá vão de boas memórias. E este facto já o reportei algumas vezes neste quinzenário.

Apesar da longevidade do entrevistado, ele mantém uma memória e gosto pela leitura invejáveis, contrastando com muitos que se deixaram envolver numa certa passividade cultural, muito fruto dos novos tempos que roubam um certo tempo ao tempo, como os canais de televisão e as redes sociais.

Deixo o amigo Francisco Sousa, que foi associado de várias coletividades e instituições antigas da Covilhã, algumas das quais ainda se mantém no ativo, como, por exemplo, sócio nº. 3 dos Leões da Floresta; integrou também os órgãos sociais de outras, como o Arsenal de São Francisco. Ele deixou uma interessante memória escrita que versa sobre a cidade naqueles tempos, altura em que o Sporting Clube da Covilhã atingiu o seu auge, com a subida à I Divisão, iniciando-se na época 1948/49, numa luta titânica com o Barreirense; a conquista da Taça “O Século”, recebida no Estádio da Tapadinha, em Alcântara, em 6/6/1948, onde foi disputar os 1/16 avos da final com o Atlético; e, posteriormente, um honroso 5º lugar na I Divisão, em 1955/56 e a final da Taça de Portugal, disputada com o Benfica, no dia 2 de junho de 1957, no Estádio Nacional. 

Hino que se cantava na cidade: “A cidade canta um hino que encanta/é uma animação, dando grandes vivas/, muitas alá-ribas/ao Sporting da Covilhã.

Que justo venceu/e assim mereceu/as festas que lhe fizeram/Honra lhe pertence/vence o Barreirense/honrando as barbas do pai.*

Na baliza, Ramalhoso tão bem se soube portar/E José Pedro, Pedro Costa e Roqui/homens de grande valor!/Fialho, Carlos Ferreira, Livramento, e Teixeira**/com Szabo*** o treinador (bis).”

*Sporting Clube de Portugal, do qual o SCC é a 8ª filial, o qual dominava na altura.

**Teixeira da Silva que mais tarde jogou no Belenenses

***Treinador e jogador do SCC.”

Francisco Sousa ainda quis recordar outros versos alusivos, e as janeiras que se cantavam na Covilhã na década de cinquenta do século passado, pela Banda da Covilhã, cuja receita era repartida a favor do Albergue dos Inválidos do Trabalho, hoje Lar de São José; e pela Creche do Menino Jesus, que se chamava na altura Florinhas da Rua. 

O nosso entrevistado aproveita esta oportunidade para desejar o renascimento do Sporting Clube Olhanense, dar os parabéns aos obreiros do Jornal Olhanense, merecendo-lhe a maior consideração por verificar que ultrapassa o âmbito desportivo, tem vários colaboradores com temas diferentes e gosta das gentes algarvias.


João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Olhanense”, de 15-11-2024)



6 de novembro de 2024

EM REDOR DE UM MONUMENTO CENTENÁRIO










 Já muito escrevi sobre o Monumento de Nossa Senhora da Conceição, da Covilhã, que foi inaugurado há 120 anos, longevidade completada no dia 10 de outubro deste ano de 2024.

Na minha crónica para o Notícias da Covilhã, em 19-03-2004, quando se aproximava o centenário, fiz referência a vários eventos que aconteceram em redor deste monumento, local aprazível e de silêncio, no recinto que é para muitos uma forma de encontrar um lenitivo, nas preces ou agradecimentos à Senhora da Conceição.

A imagem que se encontra no monumento está apresentada na configuração de Nossa Senhora de Lourdes mas é designada de Nossa Senhora da Conceição, tal como se encontra na paróquia da Covilhã com este nome. 

O engano deve-se ao facto de quando uma comissão de pessoas gradas da Covilhã resolveu mandar fazer a imagem de Nossa Senhora da Conceição, e a ter encomendado em França, aqui a confundiram com outra. Ao ser recebida a imagem encomendada, na Covilhã, verificaram então que a mesma se apresentava com as feições de Nossa Senhora de Lourdes, lapso devido ao facto de, para os franceses, o título de Conceição era para Lourdes, que apareceu a Bernardette Soubiroug, dizendo: “Eu sou a Imaculada Conceição”. Daí a confusão, que acabou normalmente por ser aceite.

Todos os acontecimentos solenes relacionados com o monumento agitaram o meio citadino, concelho e região. O ponto inicial era na Igreja de Nossa Senhora da Conceição. Multidões de pessoas, em trajetos por várias ruas e caminhos, dirigiam-se para o monumento. 

Assim aconteceu por ocasião da inauguração em 10 de outubro de 1904, pelo Bispo da Diocese da Guarda, D. Manuel Vieira de Matos. 

Outros grandes eventos aqui ocorreram, como de 26 a 29 de maio de 1954, com o “Grande Congresso Mariano da Diocese da Guarda”, no centenário de definição dogmática da Imaculada Conceição. Segundo o Notícias da Covilhã, calcularam-se em 50 000 pessoas que assistiram à procissão para o monumento de Nossa Senhora da Conceição e tomaram parte no encerramento do Congresso.  A cidade estava artisticamente engalanada, com milhares de lâmpadas no exterior das casas particulares, nos edifícios públicos e nas igrejas, ao longo do percurso. Das janelas caíam chuvas de flores e os cânticos ecoavam por toda a parte.

Vieram gentes de perto do Douro e das vizinhanças de Castelo Branco, das terras fronteiriças do Sabugal e das mais afastadas nos recantos da Serra da Estrela. Foi uma forma de celebrar por antecipação o cinquentenário da fundação do monumento. 

Recordo-me de ter lá estado com a minha família, no meio de uma imensidão de gente, distribuída por todo o recinto e fora dele, durante longas cerimónias, sentados em mantas de ourelos e almofadas, na encosta dos terrenos, à sombra dos muitos pinheiros então existentes, e com as merendas levadas de casa. Tinha 8 anos e deslumbrava-me ao ver uma avioneta a lançar flores sobre o monumento.

De 27 a 29 de junho de 1958, celebraram-se as “Festas Comemorativas do Centenário de Lourdes”. As solenidades culminaram com a romagem das freguesias do Concelho da Covilhã e de toda a região ao monumento, promovidas pela Diocese da Guarda, onde tomaram parte cerca de 20 000 pessoas, conforme regista o Notícias da Covilhã. Teve a presença do Núncio Apostólico, Cardeal D. Fernando Cento. Todos os párocos, e até escolas primárias, prepararam este evento. Distribuíram-se muitas bandeirinhas com as cores do Vaticano, aguardando a vinda do Núncio Apostólico, que foi recebido apoteoticamente no limite do distrito pelo Governador Civil e pelo Presidente da Câmara da Covilhã, Dr. José Ranito Baltazar.

À noite, a cidade apareceu com um aspeto verdadeiramente deslumbrante: as torres das igrejas, os edifícios públicos e particulares, praças, ruas e jardins surgiam iluminadas através de muitos milhares de lâmpadas e focos de luz. Espetáculo maravilhoso e raro que chamou à via pública considerável multidão. Trabalho executado sob a égide e saber de Alexandre Galvão Aibéo.

No edifício novo da Câmara Municipal da Covilhã, que iria ser inaugurado em 11 de outubro do mesmo ano, encontrava-se uma expressiva silhueta de Pio XII, aureolado pelo artístico dispositivo de luz. 

Numa sessão solene na Escola Industrial e Comercial Campos Melo da Covilhã, com a presença do Cardeal D. Fernando Cento, além da intervenção do seu Diretor, Engº. Ernesto Melo e Castro, e de outras pessoas, brilhava, num recital neste evento, com várias poesias, a antiga aluna Maria Ivone Manteigueiro (mais tarde, também Vairinho, pelo casamento), de 22 anos. *

No ano de 1961, numa impressionante romagem ao monumento, fazia-se a entrega e colocação no mesmo, duma réplica da espada de D. Nuno Álvares Pereira (hoje São Nuno Álvares Pereira), algum tempo depois da apoteótica receção das Relíquias do Santo Condestável, em 20 de maio desse ano, recebidas no largo de São João de Malta, pelo Bispo da Guarda, D. Policarpo da Costa Vaz, e demais entidades oficiais, e instituições, onde se encontrava um pelotão de militares que estavam, na altura, sediados na Torre (Serra da Estrela ) – Pelotão da Esquadra nº. 3 do Grupo de Deteção, Alerta e Conduta de Intercepção n.º 1, que  fizeram guarda de honra.  O andor, com as relíquias, que chegaram já noite avançada, fora então transportado por deputados e outras entidades oficiais, e foi objeto de uma grande saudação nos Paços do Concelho pelo Presidente da Câmara. 

Outros eventos ocorreram no Monumento de Nossa Senhora da Conceição, como a Bênção das Pastas dos finalistas da Universidade da Beira Interior (UBI). Ultimamente, face ao elevado número de finalistas, o evento tem sido transferido para o Complexo Desportivo da Covilhã.

Deixo deste local, fonte inspiradora de crónicas e de poesia para muitas gentes, a beleza de parte da que trago para os prezados Leitores, da grande poetisa covilhanense, escritora e mulher multifacetada que se radicaria em Lisboa, que já nos deixou, e que foi uma minha grande amiga, Maria Ivone Manteigueiro Vairinho:

“Covilhã, maio de 1958

Covilhã à Noite

É noite, noite de maio, calma e perfumada. Aqui do Monumento de Nossa Senhora da Conceição (local dos mais, senão o mais aprazível da cidade) contemplo a Covilhã de “fora para dentro” e, paradoxalmente, de “dentro para fora”. A imagem de Nossa Senhora ergue-se viva e suave na escuridão, olhando a cidade. Sigo o seu olhar… Espetáculo velho e sempre novo. De cada vez que a contemplo acho-lhe encantos novos, novos cambiantes, novas formas – nunca cansa. É um presépio enorme – pelo colorido e pela forma – que tenho ante os olhos. Pois se até tem o fundo habitual de qualquer presépio – serra levemente ondulada, talhada a pincel, onde um morro mais pronunciado põe um encanto especial. (…)” **

*Teve também um papel importante num recital realizado no Salão Nobre dos Paços do Concelho, no Dia da Cidade de 1998, recitando a poesia “Lua Branca em Céu Azul”.

Maria Ivone Manteigueiro Vairinho nasceu na Covilhã em 27-02-1936 e faleceu em Lisboa em 07-09-2012, encontrando-se as suas cinzas no Cemitério da Covilhã, onde já estão alguns dos seus familiares. Foi homenageada pela Câmara Municipal da Covilhã, no Dia da Cidade, a título póstumo, em 20-10-2014, com a Medalha de Mérito Municipal, categoria Prata.


**O remanescente do texto poético pode ser lido na sua obra “Livro da Dor e da Esperança”, em cuja apresentação tive o prazer de estar presente, no Salão Nobre da CMC, no dia 17-12-1999, tendo sido autografado com as sublimes palavras: “Para o querido amigo João Nunes, com um abraço grande. Maria Ivone Vairinho. 17.12.99”.

João de Jesus Nunes                                                                                            jjnunes6200@gmail.com

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 06/11/2024)


CIDADE DA COVILHÃ E O DIA DA CIDADE





 O passado da Covilhã remonta aos tempos da romanização da Península Ibérica, quando foi castro proto-histórico, abrigo de pastores lusitanos e fortaleza romana conhecida por Cava Juliana ou Silia Hermínia. Quem mandou erguer as muralhas do primitivo castelo                                                                                      foi D. Sancho I que em 1186 concedeu foral de vila à Covilhã. E, mais tarde, foi D. Dinis que mandou construir as muralhas do admirável bairro medieval das Portas do Sol.
Era já na Idade Média uma das principais “vilas do reino”, situação em seguida confirmada pelo facto de grandes figuras naturais da cidade ou dos arredores se terem tornado determinantes em todos os grandes Descobrimentos dos séculos XV e XVI: o avanço no Oceano Atlântico, o caminho marítimo para a Índia, as descobertas da América e do Brasil, a primeira viagem de circum-navegação da Terra. Em plena expansão populacional quando surge o Renascimento, o sector económico tinha particular relevo na agricultura, pastorícia, fruticultura e floresta. O comércio e a indústria estavam em franco progresso. Gil Vicente cita “os muitos panos finos”. O Infante D. Henrique, conhecendo bem esta realidade, passou a ser “senhor” da Covilhã. A gesta dos Descobrimentos exigia verbas avultadas. As gentes da vila e seu concelho colaboraram não apenas através dos impostos, mas também com o potencial humano. 
A expansão para além-mar iniciou-se com a conquista de Ceuta em 1415. Personalidades da Covilhã como Frei Diogo Alves da Cunha, que se encontra sepultado na Igreja da Conceição, participaram no acontecimento. A presença de covilhanenses em todo o processo prolonga-se com Pêro da Covilhã (primeiro português a pisar terras de Moçambique e que enviou notícias a D. João II sobre o modo de atingir os locais onde se produziam as especiarias, preparando o Caminho Marítimo para a Índia), João Ramalho, Fernão Penteado e outros.
Entre os missionários encontramos o Beato Francisco Álvares, morto a caminho do Brasil; frei Pedro da Covilhã, capelão na expedição de Vasco da Gama para a Índia, o primeiro mártir da Índia; o padre Francisco Cabral, missionário no Japão; padre Gaspar Pais que de Goa partiu para a Abissínia; e muitos outros que levaram, juntamente com a fé, o nome da Covilhã para todas as partes do mundo. Os irmãos Rui e Francisco Faleiro, cosmógrafos, tornaram-se notáveis pelo conhecimento da ciência náutica. Renascentista é Frei Heitor Pinto, um dos primeiros portugueses a defender, publicamente, a identidade portuguesa. A sua obra literária está expressa na obra “Imagem da Vida Cristã”. Um verdadeiro clássico. 
A importância da Covilhã, neste período, explica-se não apenas pelo título de “notável” que lhe concedeu o rei D. Sebastião como também pelas obras aqui realizadas e na região pelos reis castelhanos. A Praça do Município foi até há poucos anos de estilo filipino. Nas ruas circundantes encontram-se vários vestígios desse estilo. No concelho também. Exemplos de estilo manuelino também se encontram na cidade. É o caso de uma janela manuelina da judiaria da Rua das Flores. É o momento de citar o arquiteto Mateus Fernandes, covilhanense, autor do projeto da porta de entrada para as Capelas Imperfeitas, no Mosteiro da Batalha.        
As duas ribeiras que descem da Serra da Estrela, Carpinteira e Degoldra, atravessam o núcleo urbano e estiveram na génese do desenvolvimento industrial. Elas forneciam a energia hidráulica que permitiam o laborar das fábricas. Junto a essas duas ribeiras deve hoje ser visto um interessante núcleo de arqueologia industrial, composto por dezenas de edifícios em ruínas. Nos dois locais são visíveis dezenas de antigas unidades, de entre as quais se referem a fábrica-escola fundada pelo Conde de Ericeira com 1681 junto à Carpinteira e a Real Fábrica de Panos criada pelo Marquês de Pombal em 1763 junto à ribeira da Degoldra. Esta é agora a sede da Universidade da Beira Interior na qual se deve visitar o Museu de Lanifícios, já considerado o melhor núcleo museológico desta indústria na Europa. A Covilhã foi, finalmente, elevada à categoria de cidade a 20 de outubro de 1870 pelo rei D. Luís I, por ser “uma da villas mais importantes do reino pela sua população e riqueza”.                         
Volvidos 154 anos, no dia 20 de outubro de 2024, foi, mais uma vez, o ensejo para se celebrar o Dia da Cidade, com as solenidades que os momentos impõem. Foi um programa que se iniciou no início deste mês de outubro e que se estendeu até ao dia 26 do mesmo mês, com homenagens, inaugurações, visitas a obras de investimentos, bem como outras iniciativas. 
Propriamente no Dia da Cidade, domingo, 20 de outubro, foram distinguidas 12 personalidades e três instituições.
Com a medalha de ouro de mérito municipal foram agraciadas a APPACDM da Covilhã (representada pelo Presidente, António Marques), a Casa da Covilhã em Lisboa que celebra este ano o centenário da sua fundação (representada pelo Presidente da Direção, Manuel Vaz), e a Escola Pêro da Covilhã (representada pelo Diretor da Escola, Dr. Jorge Crucho). 
Com a medalha de prata de mérito municipal foram agraciados o Engº. António Correia de Sá, administrador executivo das Minas da Panasqueira; o médico e professor universitário Carlos Casteleiro, que esteve na génese da criação do serviço de gastroenterologia na ULS da Cova da Beira; o professor e presidente da Direção dos Bombeiros Voluntários da Covilhã, Joaquim Matias; o Dr. Jorge Torrão, que foi quadro técnico superior do Inatel e Coordenador Desportivo para o Distrito de Castelo Branco; o Dr. José Curto Pereirinha (a título póstumo) que exerceu funções em várias empresas da indústria têxtil da Covilhã e foi administrador das Águas da Covilhã; José Fernandes de Lemos (a título póstumo) que foi presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Lanifícios, um dos obreiros da greve dos mil escudos e um resistente antifascista; o Dr. José Luís de Brito Rocha, licenciado em Farmácia e especialista em análises clínicas, presidente da direção do Lar de S. José, empresário, com um vasto currículo, incluindo no associativismo, com uma marca no Sporting Clube da Covilhã que o levou à Primeira Divisão Nacional; Luís Patrão (a título póstumo), licenciado em Direito, que foi Presidente do Turismo de Portugal, chefe de gabinete de dois primeiros-ministros e secretário de Estado; Manuel Carrola (a título póstumo), que foi dirigente e e presidente da Mesa da Assembleia Geral e do Conselho Fiscal do Sindicato Têxtil da Beira Baixa e membro da União de Sindicatos de Castelo Branco; o Dr. Miguel Castelo Branco, médico, professor universitário e político, presidente da Faculdade de Ciências da Saúde e foi Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar da Cova da Beira; Rui Lourenço, empresário hoteleiro que criou a Residencial Santa Eufémia e a empresa de Construções Lourenço, Lda, construindo centenas de casas na Covilhã e Algarve, bem como o edifício do Centro Comercial do Sporting ou o Hotel Dona Maria; o Major-General Rui Tendeiro, natural da Covilhã, piloto-aviador e comandante Operacional da Madeira, tendo sido oficial de operações com ligação à Nato.
Muito, mas muito mais foi referido sobre as três instituições agraciadas e as ações desenvolvidas e currículos das 12 personalidades mencionadas, mas o espaço deste quinzenário é limitado, como de qualquer regular publicação. Fica o essencial e já muito se deve à deferência do diretor deste quinzenário para com o autor deste longo texto.

João de Jesus Nunes
jjnunes6200@gmail.com
(In “O Olhanense”, de 01-11-2024)

17 de outubro de 2024

O FADO

 
Domingo, 6 de outubro. Neste dia, a RTP 1 transmitiu em direto uma sessão especial do programa Em Casa D’Amália, marcando os 25 anos da morte da diva do fado. Não houve propriamente homenagens ou celebrações oficiais neste dia, ao contrário do que se passou no centenário do seu nascimento.

Vem a propósito, recordei o meu artigo “E Tudo Isto é Fado” publicado no Notícias da Covilhã, de 07-12-2011, e no Jornal do Fundão, de 15-12-2011, noutros contextos.

Nascido nos meios populares, o fado sempre soube cantar a crítica social – e aos regimes. Na noite em que a censura prévia riscava as letras que eram hostis ao Estado Novo, esse quase silêncio conduziu-o a uma forte hostilidade nos dois anos imediatos ao 25 de abril. Mas esse “triste fado” soube afastar-se e ser entendido como expressão artística que é, também associado à liberdade.

O fado é a canção melancólica de um povo que também celebra alegria. Na narrativa do quotidiano nas suas várias facetas, o fado não é uma canção triste. Tem melancolia e saudade mas também alegria e festa, e até um lado solar. Gerado nas tascas e bairros pobres de Lisboa oitocentista, foi no início a expressão de uma minoria urbana restrita, mas recebeu influências dos que foram chegando de todo o País. Há na história do fado, como na história de Portugal, uma presença constante: o mar.

Segundo fonte do Diário de Notícias, aqui reporto, cronologicamente, os primeiros e principais personagens que lhe terão estado na sua génese, e lhe deram forma e significado.  

1820 – 1846 – Maria Severa – Fadista.  Há quem considere Maria Severa uma das figuras fundadoras do fado. Nasceu no bairro da Mouraria, em Lisboa. Existem poucos dados sobre a sua vida que estejam devidamente comprovados, mas acredita-se que Severa cantava nos circuitos da prostituição no Bairro Alto e na Mouraria. Morreu bastante jovem, com apenas 26 anos de idade.

1883 – 1925 – Júlia Florista – Fadista. Foi uma das fadistas lendárias da cidade de Lisboa nos primeiros anos do século XX. Ficou conhecida como florista porque desde muito nova vendia flores para seu sustento. Era considerada uma fadista sentimental.

1891 – 1946 – Armandinho – Guitarrista. De seu nome, Armando Augusto Freire, foi uma figura fundamental na transição do fado de caráter marginal e popular do século XIX para o rosto mais contemporâneo do género no séc. XX. Alargou o vocabulário musical do fado, enquanto contrariou o protagonismo então dominante do “cantador” face à figura do guitarrista.

1888 – 1982 – Alfredo Marceneiro – Fadista. Nome incontornável na história do fado. Começou a cantar esta música ainda na adolescência, num baile popular. Profissionalizou-se no início dos anos 40.

1889 – 1973 – Edmundo Bettencourt – Poeta e Cantor. Referência incontornável na canção de Coimbra.

1895 – 1969 – António Menano – Fadista. Símbolo histórico do fado de Coimbra, foi também um cantor imensamente popular abaixo do Mondego, no fado e na canção ligeira.

1902 – 1985 – Ercília Costa – Fadista. Estreou-se a cantar o fado em 1927, no Teatro da Trindade.

1907 – 1993 – Hermínia Silva – Fadista. Ficou para a história como um dos grandes símbolos do fado “castiço”. A Casa da Mariquinhas foi o seu maior sucesso.

1907 – 1969 – Carlos Ramos – Fadista. Estreou-se em 1944 com um tema de Marceneiro, Senhora do Monte. Acompanhava-se a si próprio à guitarra.

1911 – 1997 – Berta Cardoso – Fadista. Fez carreira a cantar o fado no teatro de revista, mas também em casas de fado. Teve também um papel na internacionalização desta música.

1918 – 1993 – Maria Teresa de Noronha – Fadista. Figura que se afirmou como o paradigma do fado aristocrata.

1919 – 2008 – Fernanda Baptista – Fadista. Construiu a sua carreira cantando o fado no teatro de revista.

1919 – 1998 – Lucília do Carmo – Fadista. Veio a tornar-se uma das vozes emblemáticas do fado corrido. Era mãe de Carlos do Carmo.

1920 – 1999 – Amália Rodrigues – Fadista. É ainda nos dias de hoje considerado o maior nome do fado, tendo sido a grande responsável pela sua internacionalização. Foi também Amália Rodrigues a primeira fadista a cantar poemas de nomes como David Mourão Ferreira, Ary dos Santos e até de Luís de Camões. Também teve uma carreira no cinema como atriz. Encontra-se sepultada no Panteão Nacional.

1920 – 2000 – Alberto Ribeiro – Fadista. Ator de cinema, tenor e fadista. Atuou ao lado de Amália Rodrigues no clássico filme Capas Negras.

1920 – 2021 – Joel Pina – Violista/Guitarrista. Um dos fundadores do Conjunto Raul Nery (com Nery, Fontes Rocha e Júlio Gomes), que acompanhou Amália Rodrigues. Joel Pina, natural do Rosmaninhal, Idanha-a-Nova, acompanhou a fadista durante mais de 30 anos. Começou aos 8 anos a tocar bandolim e distinguiu-se no violão baixo.

1921 – 2012 – Raul Nery – Guitarrista. Um dos maiores nomes da guitarra portuguesa no fado, formou em 1959 o Conjunto de Guitarras Raul Nery, quarteto de elite que acompanhou Amália Rodrigues durante os seus anos dourados. Fora do conjunto, tocou também com Hermínia Silva e Maria Teresa de Noronha, numa carreira que contou mais de seis décadas. Era pai do musicólogo e historiador do fado Rui Vieira Nery.

1922 – 1995 – Manuel de Almeida – Guitarrista. Figura de renome nos retiros e casas de fado lisboetas.

1923 – 2018 – Celeste Rodrigues – Fadista. Fadista tradicional e irmã de Amália Rodrigues.

1924 – 2015 – Deolinda Rodrigues – Fadista. Estreou-se no teatro de revista em 1947, ao lado de Hermínia Silva.

1925 – 2004 – Carlos Paredes – Guitarrista.

1926 – 2019 – Argentina Santos – Fadista.

1926 – 2011 – José Fontes Rocha – Guitarrista.

1928 – 1999 – António Brojo – Guitarrista.

1928 – 2016 – Vicente da Câmara – Fadista.

1928 – 1988 – Fernando Farinha – Fadista.

1933 – 2003 – Fernando Maurício – Fadista.

1933 – 2012 – Luiz Goes – Fadista. Expoente do fado de Coimbra.

1934 – 2015 – Fernando Alvim – Violista

1934 – Frei Hermano da Câmara – Fadista. É um cantor e monge beneditino português. Defende o apostolado através da música para edificar a civilização do amor e promover a cultura da paz.

Muitos mais poderíamos nomear, como Carlos do Carmo, já falecido, João Braga e Nuno da Câmara Pereira, mas a lista já vai longa, pelo que ficamos por aqui.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Olhanense”, de 15-10-2024)



9 de outubro de 2024

TEMPOS DE OUTROS TEMPOS

 

Iniciei esta crónica na manhã do último dia de setembro, ainda sem saber como lhe inserir um conteúdo que não fosse pessimista face aos tempos que correm, mas antes encontrar uma dose de otimismo mais adequada no caminho daquele lenitivo que necessitamos para os acontecimentos que nos chegam todos os dias.

Sobre a minha secretária, n’ “O Mensageiro”, de outubro 2024, na rubrica Sessão com Arte, Isabel Maria Mónica em “Tecer de Verão o Tempo”, escreve “quando damos por nós já estamos em modo de repetição desenfreada mal pensando nas nossas ações e decisões diárias. Face a este ritmo acelerado, importa recordar o verão com o coração agradecido e disponível”.

“O Papa Francisco foi o primeiro a dizer-nos que vivemos uma terceira guerra mundial aos pedaços” – escreve a jornalista Rosário Salgueiro. O mês de agosto alertou-nos que a crise atual ‘parece permanentemente imparável’. Estamos todos cansados desta tensão, destes conflitos que, mais ou menos longínquos, nos atingem a todos. Há nestes dias negros de guerras, um claro “fracasso da política e da humanidade”.

Este verão começou lindo e tranquilo, terminou violentamente, transformado em luto e trauma para várias famílias.

Olhando para a paisagem do mês de outubro, é este marcado pela mudança da cor das folhas, que começam lentamente a cair com a chegada do outono. Vai haver mudança de hora, marcando a diminuição das horas de sol. Como a vida é feita de ciclos, alguns são de declínio, de debilidade e de fim.

Das memórias que vou trazendo para os prezados Leitores, quer sejam da região serrana, com destaque a Covilhã, quer de formulada opinião, podem ser lidas nos jornais ou online.

Folheando ocasionalmente uma das minhas compilações, vieram-me à mão, do ano 1943, notícias de alguns acontecimentos marcantes na vida da cidade laneira.

No dia 1 de maio de 1943, o Notícias da Covilhã publicava no seu semanário, destacando o título “IGREJA DE SANTA MARIA”: “Estão já em curso as obras de reparação de que carecia a sua Igreja Paroquial”, que “bem se pode chamar a Igreja Matriz da Covilhã”. No entanto, no mesmo semanário de 18-07-1943, a primeira página dava conta em grandes parangonas –“Horrível Tragédia – A Covilhã Inteira de Luto –, que, no passado dia 13, no preciso momento em que se concluía a Missa em honra de Nª Sª de Fátima, desabou uma parte do teto da Igreja de Santa Maria, sepultando nos escombros uma parte dos fiéis que assistindo ao piedoso ato, uma imprevidência incompreensível e inexplicável do empreiteiro que tem a seu cargo as obras em curso na dita Igreja, provocou grande desgraça que já custou a vida a sete mulheres, havendo muitas dezenas de feridos mais ou menos graves. O pânico dos feridos e o pânico muito maior das famílias que tinham membros na Igreja era indiscritível na natural ansiedade em os procurar”.

No dia 17 de janeiro de 1943, o Notícias da Covilhã dava notícia, na primeira página, que “O Exm.º Sr. Engenheiro Duarte Pacheco é cidadão da Covilhã. O Sr. Ministro das Obras Públicas aprovou o projeto da Praça do Município, e para a sua realização concedeu a verba de 812 contos”. Entretanto, este ministro veio a falecer de acidente de viação, em Setúbal, em 16 de novembro do mesmo ano. Em 28-11-1943, a Câmara Municipal da Covilhã dignou-se promover os sufrágios que se realizaram na Igreja da Misericórdia, no 7º. Dia do passamento do desventurado ministro. O malogrado estadista louletano tratava a Covilhã com carinho e devoção inexcedíveis, de que são expoentes as obras em curso, da Praça do Município, os Bairros Económicos, a nova Cadeia e, no zénite de todas elas a Praça Fechada (designa-se atualmente Mercado Municipal, tendo sido inaugurado no dia 08-12-1943). Este Praça Fechada foi a primeira do País que o ilustre finado não teve tempo de inaugurar.

Neste ano de 1943 (*) deu-se também um grande incêndio no Tribunal Judicial, onde atualmente se situa a Igreja do Sagrado Coração de Jesus, mais conhecida por Igreja de S. Tiago, o qual foi devorado pelo fogo a 27 de novembro de 1942 (**). Recuperado pelos Jesuítas em 1947, o novo edifício reabriu ao culto a 10 de fevereiro de 1952.

Ainda o Notícias da Covilhã de 04 de janeiro de 1943 dava a notícia do novo Pároco de S. Pedro: “Sem receio de contradita, podemos dizer, afoitamente, e até alegremente, que foi um acontecimento citadino a posse do novo pároco de S. Pedro, Sr. Padre José Domingues Carreto, aparentado como ilustre Reitor dos nossos seminários, Monsenhor Santos Carreto, cujas virtudes herdou. A cerimónia estava marcada para as 11,30 vendo-se a essa hora repleta de fiéis a pequena capela de S. João de Malta, servindo atualmente de Paroquial”. Substituiu o Arcipreste, Padre Gregório Lopes Arroz.

Por último, e porque falei da Igreja de S. Tiago, recordo que no dia de Todos os Santos, um domingo de 1 de novembro de 1953, faleceu, quando celebrava a Santa Missa, no momento da homilia, o Padre Jesuíta José Moreira da Cunha, com 67 anos.

Também muitos ainda se devem recordar do Irmão Tobias Gaspar (Jesuíta), falecido em 14-01-1996, com 85 anos. Esteve na Companhia de Jesus 66 anos, e a maior parte deles vividos na Covilhã (S. Tiago), durante quase 49 anos.

(*) Reportado no livro “Vida e Obra dos Bombeiros Voluntários da Covilhã”, pág. 321, cujo ano do incêndio não coincide com o referido no livro “História Urbana em Postais e Fotografias da Freguesia de São Pedro da Covilhã (1890-2000)” (**), pág. 61, pelo que carece de mais informação, para o cabal esclarecimento.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 09-10-2024)

4 de outubro de 2024

OLIVENÇA E A “REAL POLITIK”


 


Vem este texto a propósito das enérgicas palavras que disparou o Ministro da Defesa, Nuno Melo, no dia 13 de setembro, aquando da sua participação na cerimónia comemorativa do Dia do Regimento de Cavalaria nº. 3 (RC3), em Extremoz, onde passou parte do serviço militar. O seu pecado foi ter tido a coragem de lembrar que Olivença é portuguesa, “de jure” e não “de facto”, desde o tratado de Alcanizes em 1297. Só que Espanha, na sua chico- espertice anexou Olivença mantendo-a integrada na província de Badajoz. No entanto, deve ser devolvida a Portugal, conforme tratado do Congresso de Viena de 1815, e que em 1817 a Espanha reconheceu a soberania portuguesa. Por isso mesmo, aquela unidade militar portuguesa é também conhecida por Dragões de Olivença.

Não é que eu tenha qualquer simpatia por Nuno Melo, penso, contudo, que poderia ter tido um pouco mais de moderação nas suas palavras. Mas também discordo em parte das de Pedro Nuno Santos, líder do PS, bem como das de Sérgio Sousa Pinto, comentador político do mesmo partido, vindo logo a assustar com possíveis represálias de Espanha. Foram na onda do alcaide de Olivença Manuel José González Andrade, tendo dito que os discursos que procuram “separar através das fronteiras, no século XXI, foram mais que esquecidos e pertencem a séculos passados”.

Enfim, conforme refere o Público, de 13-09-2024, “apesar da diplomacia portuguesa continuar, sem reconhecer a soberania espanhola sobre Olivença, o tema chega a ser ‘não-assunto’ entre os dois Estados, não perturbando as relações”. O que é certo é que Olivença celebra o Dia de Portugal e a população continua a procurar preservar o legado português, desde a língua à nacionalidade.

Para Carlos Luna, historiador e membro do Grupo dos Amigos de Olivença, as declarações de Nuno Melo não fazem mais do que chamar à atenção para uma posição que Portugal tem mantido há dois séculos e que continua por resolver.  “Creio que o Estado português poderia pressionar Madrid, pelo menos no sentido de autorizar que os oliventinos conhecessem a sua própria história logo na escola”. Este ativista da causa de Olivença considera que a ação espanhola na localidade “só pode ser considerada como colonizadora”.

Olivença tinha 11 871 habitantes em 2021. Esta cidade dista 23 Km de Elvas, 24 Km de Badajoz, 236 Km de Lisboa e 424 Km de Madrid. Pertenceu a Portugal desde a sua fundação, no século XIII após a reconquista cristã, e foi integrada no território português pelo Tratado de Alcanizes, em 1297, conforme inicialmente referido, durante o reinado de D. Dinis. Em 1801, durante a chamada Guerra das Laranjas, Olivença foi ocupada por Espanha, e a sua posse foi confirmada pelo tratado de Badajoz, assinado nesse mesmo ano, embora Portugal nunca tenha oficialmente reconhecido a anexação. A 14 de agosto de 1805 era lavrada a última ata da Câmara e Olivença em língua portuguesa. Longe da ameaça de Napoleão, em 1 de maio de 1808, o príncipe regente D. João (futuro D. João VI) publica no Rio de Janeiro, então capital do Império Português, um manifesto no qual repudia o Tratado de Badajoz. Em 1811, Olivença é temporariamente ocupada por contingentes luso-britânicos sob o comando de Lord Beresford. Após o Congresso de Viena de 1815 que sucedeu às Guerras Napoleónicas, as potências europeias decidiram que Olivença deveria ser devolvida a Portugal, mas a Espanha nunca implementou essa restituição, e a cidade permaneceu sob administração espanhola até hoje. Em 1821, a partir do Brasil, Portugal ocupou a Província Cisplatina (atual Uruguai). Este facto serviu de justificativa espanhola para interromper as conversações sobre a devolução que decorriam. Paralelamente, Espanha argumentou (e continua a argumentar) que o Tratado de Badajoz de 1801 continua válido e que o Tratado de Viena não tem força legal suficiente para obrigar à entrega de Olivença a Portugal. Entretanto, em 1840 passou a ser proibido o uso da língua portuguesa no território, incluindo nas igrejas, conforme narrado na Wikipédia.

Na segunda metade do século XX, o general Humberto Delgado e o almirante Pinheiro de Azevedo foram fervorosos adeptos da recuperação de Olivença, tendo ambos desempenhado funções de destaque no Grupo dos Amigos de Olivença, fundado em 1944.

A Covilhã tem uma rua com o nome Rua de Olivença, que substituiu a antiga denominação de Rua do Vigário. Foi inaugurada no início do ano 1956, de harmonia com o deliberado pela edilidade covilhanense, sob a presidência do coronel António Matoso Pereira, em cuja ata da sessão camarária de 24-01-1956, referia: “Rua de Olivença – Datado de 12 do corrente, do secretário-geral do Grupo Amigos de Olivença, solicitando à Câmara que a uma das artérias desta cidade seja dado o nome de ‘Olivença’. Informo ainda que, gostosamente, o Grupo Amigos de Olivença levaria a efeito uma conferência desta cidade sobre o elevado significado do nome da nova artéria, no dia da sua inauguração. A Câmara considerou este pedido e deliberou que à atual Rua do Vigário seja dado o nome de Rua de Olivença, o que deverá ser comunicado ao Grupo dos Amigos de Olivença”.

Ora bem, recordo-me perfeitamente desta inauguração, cuja data exata desconheço pois não consultei mais atas da Câmara Municipal da Covilhã ou do Arquivo Municipal. Tinha 9 anos e andava na 3ª. Classe (hoje 3º. Ano), no Asilo – Associação Protetora da Infância Desvalida, como se designava. Nesta escola pertencíamos à Mocidade Portuguesa e entregavam-nos uma farda para os dias festivos, como participar nas comemorações do 1.º de dezembro e Procissões do Senhor dos Passos e Enterro do Senhor, como também em outros eventos que recordo: receção aos militares que regressavam da Índia Portuguesa, junto à Câmara Municipal, no Pelourinho.

Outro dos eventos seria (mas não foi da minha parte) participar fardado da Mocidade Portuguesa, junto ao local onde foi a inauguração da Rua de Olivença. Não me desloquei porque estava uma tempestade, chovia torrencialmente, e a conselho de meu Pai, não saí de casa.

Na situação atual, embora Olivença esteja sob controle espanhol, a questão permanece formalmente não resolvida. Portugal mantém a sua reivindicação, embora o assunto não cause tensões diplomáticas significativas nos dias de hoje. A cidade e a sua cultura refletem uma mistura de influências espanholas e portuguesas, com muitos dos seus habitantes falando ambos os idiomas e com tradições culturais que unem os dois países. Na atualidade, Portugal não reclama abertamente Olivença, mas também não renuncia à sua pretensão.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Olhanense”, de 01-10-2024)


ASSOBIAR PARA O LADO

 

Neste mês de setembro temos o término das férias da generalidade das gentes das nossas gentes, e das outras gentes a viver por este país fora, quer seja no Continente ou nas Regiões Autónomas, depois de um calor abrasador, apesar de flores coloridas que nos foram rodeando.

É o regresso às tarefas profissionais para uns, enquanto, para outros, além do retorno às aulas nas escolas, é também a azáfama de encontrar casas ou quartos para os que entram pela primeira vez nas universidades.  As preocupações económicas com os gastos acrescidos, são agora mais patentes, enquanto as ações governativas tendentes a serem encontradas, em devido tempo, soluções para estes problemas, é, mais uma vez, numa de assobiar para o lado.

Os partidos políticos, em vez da sua união em prol dos verdadeiros interesses dos cidadãos, vão-se guerreando, na pretensão de fazer desfraldar as suas bandeiras mais que as outras, aproveitando a agitação de alguns ventos, assobiando para o lado quando o grito de revolta dos prejudicados, e dos mais necessitados, se faz sentir.

Mas isto já não é de agora, é de sempre. As promessas vãs, entre as quais se sobressaem a irrevogabilidade das palavras ditas, cujo substantivo, certamente saído traiçoeiramente da voz de quem o pronunciou, acaba, quantas vezes adornado de outra forma de anular a decisão tomada. Basta assobiar para o lado.

Recentemente foi a fuga de cinco reclusos perigosos do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, um local considerado altamente seguro, mas, talvez em situações de assobiar para o lado nas decisões ou cautelas acrescidas a tomar, vimos que “de alta segurança” transformou-se numa escada “de alta descida” dos presos que assim se aproveitaram da “incompetência” e “cadeia sucessiva de erros e falhas” nas palavras da ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice.

E que dizer da corrupção que cada vez mais portugueses a consideram como prática comum no nosso país? Se não se assobiasse tanto para o lado e se de frente se enfrentassem os problemas com eficácia, numa severidade na aplicação das penas, em tempo célere como noutros países e não naquele coçar da cabeça, deixando que os processos sejam anulados por terem ultrapassado o prazo, certamente tudo seria mais fácil, mandando à fava a nossa peculiaridade dos brandos costumes.

Não estou a incitar à violência, nem a olvidar a tolerância, mas o que é certo e verdade é que a paciência tem limites quando aos nossos olhos se nos depararam com tanto casos de rebeldia profissional numa só de exigência de direitos ocultando os deveres para com o cidadão, muitas vezes envoltos na manta da vitimização.

Fico por aqui, neste âmbito, para evitar más interpretações. No entanto, na edição de 2023 do Índice de Perceção da Corrupção, publicado anualmente pela Transparency International, revela que o combate à corrupção em Portugal continua a não avançar e tem falhas ao nível da integridade na política. Portugal, que é avaliado no conjunto dos países da Europa Ocidental e União Europeia, obteve 61 pontos, fixando-se na 34ª posição em 180 países.

A corrupção é vista como prática generalizada no nosso país por parte de 96% dos portugueses, um número que coloca Portugal como o segundo país da União Europeia (UE)  onde a perceção deste crime é maior, de acordo com o mais recente Eurobarómetro.

Terminado o mês de agosto, os emigrantes viram chegar o fim das suas visitas à terra, familiares e amigos. Fizeram-no numa época em que o termo migração é mais europeu e atual do que nunca. Porém, na memória coletiva, as experiências migratórias permanecem abafadas, naquele assobiar para o lado. O silêncio em torno do 60º aniversário do tratado laboral entre Portugal e a Alemanha, assinado a 17 de março de 1964, que serviu de enquadramento legal para a emigração de milhares de portugueses para um dos principais destinos diaspórios do pós-guerra é sintomático disso, segundo nos narra Clara Ervedosa, no Público de 23-8-2024. “A Alemanha e Portugal são países com uma geografia, história e cultura distintas: Portugal fica no extremo sudoeste da Europa e as suas fronteiras são as mais antigas do continente. Possui uma identidade nacional estável e absorve facilmente o que é estrangeiro. A Alemanha define-se como país situado ‘no coração da Europa’, está rodeada de nove países com quem disputou fronteiras, tendo a última alteração territorial ocorrido há apenas 33 anos”, com a reunificação alemã em 1980, que marcou o fim da divisão entre Alemanha Ocidental (República Federal da Alemanha) e Alemanha Oriental (República Democrática Alemã) que existiam separadamente desde o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. A reunificação oficial aconteceu em 3 de outubro, após a queda do Muro de Berlim em novembro de 1989. Como se devem recordar, este processo trouxe a integração dos territórios da Alemanha Oriental à República Federal da Alemanha, resultando no que hoje é o território unificado da Alemanha.

E porque desta vez quis salientar a apatia que vai existindo em muito boa gente deste país, naquele de assobiar para o lado, qual Lucília Gago, atual Procuradora-Geral da República, no final do seu mandato, mas na saudade da recentemente falecida, Joana Marques Vidal, não posso deixar de recordar um meu artigo publicado no Notícias da Covilhã, em 24-12-2004, já lá vão 20 anos, sob o título “O ‘OH!’ E O ‘AH!’”, sobre a corrupção.

Para ultimar este texto, que já vai longo, e pegando exclusivamente nas duas interjeições atrás referidas, quero com elas retificar o último parágrafo do meu artigo do último número d’ “O Combatente da Estrela’”, nº. 135, JUL/2024, sob o título “Tempo de férias mas também de reflexão”, numa mea culpa pelo lapso ocorrido sobre Luís de Camões, onde referi: “E assim termina a vida de Luís de Camões, mas fica na imortalidade de Portugal e do Mundo, em que o seu linguajar literário foi sempre reconhecido como erudito. Ele não escrevera para ignorantes”. Deveria ser, mais ou menos neste sentido, que aquela parte deverá substituir: “E assim termina a vida de Luís de Camões, mas ele permanece na imortalidade de Portugal e do mundo, onde sua linguagem literária sempre foi reconhecida como erudita. Ele não escrevia para ignorantes”.

(Este texto foi escrito na noite do dia 12-09-2024)

 

João de Jesus Nunes