18 de setembro de 2025

ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS: A DANÇA DAS CADEIRAS POLÍTICAS

 

À medida que se aproximam as eleições autárquicas, o país veste-se de cartazes, slogans ambiciosos e promessas renovadas – muitas vezes, apenas recicladas. Multiplicam-se candidatos, cada um mais convicto do que o outro de possuir a chave para o desenvolvimento local.

Há quem veja este momento como a festa da democracia local; outros, com um certo ceticismo, assistem ao desfile de rostos sorridentes e frases feitas, perguntando-se se, por trás de tanta cor e otimismo, não se esconde o mesmo enredo de sempre, num palco de vaidades e estratégias pessoais, onde os eleitores se veem mais como plateia do que como protagonistas.

Curioso é notar que, entre tantos candidatos, alguns, já sem possibilidade de renovar o mandato no seu concelho, decidem aventurar-se em novas praças. A geografia política parece, assim, um tabuleiro de xadrez onde o importante é não perder o lugar de topo. Trocam-se freguesias por cidades, concelhos por vilas, mas permanece a ambição de se manter na ribalta.

Trocam-se concelhos como quem troca de camisola – mas como o mesmo objetivo: não perder o poder

Não que falte legitimidade a quem deseja continuar a servir a causa pública. Porém, esta “dança de cadeiras” levanta questões inevitáveis: trata-se de vocação ou de carreira? De serviço ou de poder? Em ano de eleições, o eleitorado, tantas vezes esquecido entre mandatos, volta a ser cortejado. E, entre promessas e discursos inflamados, cabe a cada cidadão separar o trigo do joio, distinguir quem de facto se compromete com a terra de quem apenas procura mais um degrau na escalada política.

Curioso é o número de candidatos dispostos a tudo para manter o “lugar de topo”. Até que ponto esta mobilidade reflete vontade de servir, ou apenas medo de desaparecer dos holofotes?

Entre mandatos, o eleitorado parece esquecido. Mas, quando chega setembro ou outubro, todos voltam a bater à porta do povo, com um sorriso treinado e uma mão estendida.

Cabe, por isso, a cada cidadão – o único que tem, de facto, a chave da mudança – avaliar com rigor quem se apresenta. Olhar para além dos cartazes, ouvir para lá das promessas e, sobretudo, perceber quem tem trabalho feito e quem vive apenas de ambição.

A democracia vive da escolha consciente e informada. As autárquicas são um ato de confiança. Que não nos deixemos levar pela espuma dos dias nem pelo marketing político. Porque, no final, a verdadeira força da democracia não está nas cadeiras que alguns disputam, mas na lucidez com que o povo escolhe quem se senta nelas.

Que estas eleições autárquicas sirvam, então, para reforçar a voz dos cidadãos, mais do que alimentar vaidades ou perpetuar jogos de poder. Porque, no fim, o verdadeiro protagonista deveria ser sempre o povo – aquele que, em silêncio, decide o rumo das suas terras e confia, a cada quatro anos, que os eleitos honrem o peso do voto que lhes foi dado.

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Olhanense”, de 15-09-2025)

17 de setembro de 2025

A POLÍTICA EM ROTAÇÃO: REFLEXÕES SOBRE AS ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS


 

À medida que se aproximam as eleições autárquicas, o país enche-se de cartazes, slogans ambiciosos e promessas renovadas – muitas vezes, apenas recicladas. Multiplicam-se candidatos, cada um mais convicto do que o outro de possuir a chave para o desenvolvimento local.

Para uns, este é o momento alto da democracia de proximidade; para outros, com um certo ceticismo, não passa de um desfile de rostos sorridentes e frases feitas. Perguntam-se se, por trás de tanta cor e otimismo, não estará o mesmo enredo de sempre, num palco de vaidades e estratégias pessoais, onde os eleitores são tratados mais como plateia do que como protagonistas.

É curioso notar que, entre tantos candidatos, alguns impossibilitados de renovar o mandato no seu concelho, decidem aventurar-se em novas praças. A geografia política transforma-se, assim, num tabuleiro de xadrez onde o essencial parece ser não perder o lugar de destaque. Trocam-se freguesias por cidades, concelhos por vilas, mas a ambição mantém-se: continuar na ribalta.

Trocam-se concelhos como quem troca de camisola – sempre com o mesmo objetivo: não largar o poder.

Nada há de ilegítimo em quem deseja continuar a servir a causa pública. Contudo, esta “dança de cadeiras” levanta inevitáveis questões: trata-se de vocação ou de carreira? De serviço ou de poder? Em ano de eleições, o eleitorado, tantas vezes esquecido entre mandatos, volta a ser cortejado. Entre promessas e discursos inflamados, cabe a cada cidadão separar o trigo do joio, distinguindo quem de facto se compromete com a terra de quem apenas procura mais um degrau na escalada política.

A quantidade de candidatos dispostos a tudo para manter o “lugar de topo” é reveladora. Até que ponto esta mobilidade traduz genuína vontade de servir ou apenas medo de desaparecer dos holofotes?

Durante os mandatos, o eleitorado parece cair no esquecimento. Mas quando chega setembro ou outubro, todos regressam às ruas, de sorriso treinado e mão estendida, à procura de votos.

Por isso, cabe a cada cidadão – o único que detém, de facto, a chave da mudança – avaliar com rigor quem se apresenta. Olhar para além dos cartazes, ouvir para lá das promessas e, sobretudo, perceber quem tem trabalho feito e quem vive apenas de ambições pessoais.

A democracia vive de escolhas conscientes e informadas. As autárquicas são um ato de confiança. Não nos deixemos levar pela espuma dos dias nem pelo marketing político. No final, a verdadeira força da democracia não está nas cadeiras disputadas, mas na lucidez com que o povo decide quem se senta nelas.

Que estas eleições autárquicas sirvam, assim, para reforçar a voz dos cidadãos, em vez de alimentar vaidades ou perpetuar jogos de poder. Porque, no fim, o verdadeiro protagonista deveria ser sempre o povo – aquele que, em silêncio, traça o destino das suas terras e confia, a cada quatro anos, que os eleitos honrem o peso do voto que lhes foi dado.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 17-09-2025)

 

 

 

 

11 de setembro de 2025

DOLOROSA MISSÃO NUM PAÍS A ARDER



 

Mais uma vez, a Covilhã veste-se de luto. Mais uma vez, um bombeiro não regressou ao quartel, à família, aos amigos. A tragédia aconteceu a caminho de um incêndio, tal como em cinco anteriores casos que narrei no meu livro Vida e Obra dos Bombeiros Voluntários da Covilhã, publicado em 2004.

Há 12 anos senti a mesma dor ao escrever um artigo sob o falecimento de outro valoroso combatente pela paz, apanhado pelas chamas, que intitulei Mártires pela Paz, recordando então os que já tinham tombado.

Daqui se conclui que o perigo não está apenas nas chamas que consomem florestas e casas, mas também em cada quilómetro percorrido, em cada estrada, em cada instante em que se parte de farda vestida, com a missão de proteger e salvar.

Cada vez que a sirene ecoa na cidade, sabemos que há vidas em risco, que há património e memórias ameaçados. Mas, para os nossos bombeiros, cada toque da sirene é também um salto para o desconhecido. Partem sempre com coragem, conscientes de que podem não regressar. E quando não regressam, a dor espalha-se como um fogo que nenhuma água consegue apagar.

Não é a primeira vez que a Covilhã chora os seus soldados da paz. Já outros tombaram no combate aos incêndios, já outros se ofereceram em sacrifício, sem nunca recuar perante o dever.

Quando o fumo se levanta ou o socorro é solicitado, nenhum homem ou mulher das Corporações de Bombeiros deixa de se aprontar para ajudar o seu semelhante. E fá-lo sem vaidade, sem esperar recompensa, mas apenas com o sentido maior da expressão “amor ao próximo”.

Assim, muitos heróis integram já a longa história dos Bombeiros Voluntários da Covilhã (BVC), instituição gloriosa que completou recentemente 150 anos de existência, marcada por inúmeras ações de valentia no salvamento de pessoas e bens.

Foram já muitos os covilhanenses – de raiz ou de coração, da cidade ou das aldeias – que viram a sua vida ou património salvos pelos bombeiros. Outros, infelizmente, não puderam ser poupados à força devastadora dos incêndios que, ano após ano, assolam o país e deixam um rasto de prejuízos, alguns irreparáveis.

Com a morte trágica de mais um valoroso elemento dos nossos BVC, ocorrida no domingo, 17 de agosto, Daniel Bernardo Agrelo, de 44 anos, casado e pai de um filho menor de 14, totalizam-se já oito mártires ao serviço desta associação que ostenta, com honra, as insígnias do Grau de Cavaleiro da Ordem Militar da Torre e Espada, Valor, Lealdade e Mérito, atribuídas pelo Governo em 03-02-1928.

A primeira vítima – Abílio Adelino Sousa, fundador dos BVC – perdeu a vida num fatídico domingo, 18 de fevereiro de 1883, durante um exercício.

O segundo mártir – Sebastião dos Santos Júlio, altamente condecorado por atos de bravura – faleceu num acidente de viatura, numa 5ª feira a 10 de setembro de 1931, quando se deslocava para um incêndio. Tinha já salvo oito pessoas no incêndio da Mineira, na noite de 14-06-1907, ato pelo qual foi distinguido com a Medalha de Prata de D. Maria II. Em janeiro de 1932, o Governo da República concedeu-lhe, a título póstumo, o Grau de Cavaleiro da Ordem Militar da Torre e Espada.

A terceira vítima – Mário Dias Tarouca – morreu na madrugada de 12 de abril de 1936 (domingo), cerca das 2 horas da manhã, em consequência de um desastre durante o incêndio da fábrica Manuel Lino Roseta.

As quarta, quinta e sexta vítimas mortais – António Miguel Vaz Marques, Ricardo Bruno de Jesus Cardona e Fernando Manuel Sousa Xistra, sucumbiram na sexta-feira, 2 de agosto de 1996, no trágico acidente aéreo do helicóptero que combatia incêndios florestais na Covilhã.

No feriado de 15 de agosto de 2013 (quinta-feira), a Covilhã perdeu mais um bombeiro, Pedro Miguel de Jesus Rodrigues, apanhado pelas chamas no sul do concelho, sem conseguir fugir.

Hoje, com dor renovada, vejo-me obrigado a acrescentar mais um nome a essa galeria de heróis.

O país continua a arder, ano após ano. Continuamos a assistir ao flagelo que destrói não apenas árvores, mas aldeias, lares, sonhos e, tantas vezes, vidas humanas. Até quando aceitaremos que este sofrimento faça parte do calendário de verão? Até quando permitiremos a floresta desordenada, a prevenção esquecida, e os nossos bombeiros lançados para a frente da batalha sem todas as condições que merecem?

A morte de um bombeiro não pode ser apenas notícia de um dia. Não pode ser apenas uma lágrima que cai e logo se seca. Honrar os nossos bombeiros é muito mais: é preservar a memória dos que tombaram, é cuidar dos que continuam vivos e ativos, é trabalhar para que estas tragédias sejam cada vez menos frequentes.

Hoje, mais um Mártir da Esperança se junta à história dos Bombeiros da Covilhã. Partiu demasiado cedo, mas deixou-nos uma herança de coragem e de serviço. Que o seu nome não se apague. Que o seu exemplo não se esqueça.

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

 

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 09-09-2025)

5 de setembro de 2025

Volta a Portugal: Memórias e Emoções de Ontem e de Hoje

 

No final de uma época futebolística que deu brado e provocou acesas discussões entre adeptos de diferentes clubes, paradoxalmente inicia-se uma nova fase desportiva, com a entrada para um novo campeonato – a época 2025/2026 – carregada de expectativas e emoções.

Com o calor de verão, regressa o ciclismo vibrante: a Volta a Portugal em Bicicleta, ou simplesmente “a Volta”. Está já a caminhar para o centenário, pois a 1ª edição realizou-se  em 1927.

A comunicação social esteve na origem da sua organização, numa parceria entre os jornais Diário de Notícias e Os Sports, inspirando-se no Tour de France, criado pelo jornal L’ Auto em 1903.

A Volta surgiu depois do Giro d’ Itália, organizado pela La Gazzetta dello Sport em 1909, e antes da Vuelta a España, criada pelo jornal Informaciones em 1935. Tanto a Volta a Portugal como o Tour se distinguem de outras provas pela forma como, nos seus primeiros traçados, seguiram de perto a fronteira territorial dos respetivos países, acompanhando os seus contornos durante várias décadas.

A primeira edição da Volta iniciou-se a 26 de abril de 1927 e percorreu o país durante 20 dias, num percurso de 2000 km, distribuídos por 18 etapas. Terminou com uma receção apoteótica em Lisboa. O vencedor foi António Augusto de Carvalho, do Carcavelos, que inaugurou a galeria de campeões da chamada “Prova Rainha” do ciclismo português.

Na adolescência como tantos portugueses, ganhei entusiasmo por esta competição. Entre as figuras marcantes da época estavam Alves Barbosa, do Sangalhos, e Ribeiro da Silva, do Académico do Porto – este último falecido tragicamente num acidente de motorizada em 9 de abril de 1958.

Nos anos 60, o F. C. Porto destacou-se com ciclistas como Carlos Carvalho, Sousa Cardoso, Mário Silva e José Pacheco. Mas em 1963 o título foi para João Roque, do Sporting CP, e, em 1965, para Peixoto Alves, do Benfica.

Em 1967, pela primeira vez, a Volta foi conquistada por um estrangeiro: Antoine Houbrechts, da Flandria.  

Na década de 70 surgiu um nome incontornável do ciclismo português: Joaquim Agostinho, do Sporting CP, vencedor das edições de 1970, 1971 e 1972. Outros corredores de relevo seguiram-se, como Fernando Mendes e Firmino Bernardino, do Benfica.

A partir dos anos 80, surgiram novas figuras entre as quais Marco Chagas, que venceu em 1982, 1983, 1985 e 1986, representando o F. C. Porto e, mais tarde, o Sporting C. P.

Houve também nomes que marcaram várias edições, mas nunca conseguiram vencer a geral, como Jorge Corvo, do Ginásio de Tavira, e, já no século XXI, Cândido Barbosa, da Liberty Seguros.

Na minha memória, permanece viva a edição de 1962. A 12 de julho, um domingo, eu, o meu irmão e alguns amigos da Covilhã partimos para as Penhas da Saúde, sem autorização dos pais, para assistir ao final da etapa. Seguindo atalhos pela serra, encontrámos um ambiente vibrante: público entusiasta, caravanas promocionais, bonés, brindes e a expectativa pela chegada dos heróis da estrada.

Nesse dia, o grande protagonista foi João Centeio, do Águias de Alpiarça. Na 12ª etapa, de 175 Km entre Portalegre e Penhas da Saúde, chegou com larga vantagem – cerca de 30 minutos sobre o segundo classificado, segundo o Diário de Notícias de 11 de agosto de 2005. “Quando lá chegou, atirou-se para a piscina”.  Segundo testemunhos, arrancou na “Varanda dos Carqueijais” – cerca de cinco quilómetros após o início da subida, onde a inclinação chega a 13%   – e deixou todos para trás. Terminou com 11 minutos de vantagem sobre o segundo. Apesar da façanha, Centeio nunca venceu uma Volta: em 1962 terminou apenas em 31º, devido a várias quedas. Este carismático ciclista já faleceu. * Mas não desapareceu do imaginário das gentes da serra.

O vencedor da 25ª Volta, em 1962, foi José Pacheco (F. C. Porto), seguido de Peixoto Alves (Benfica) e Jorge Corvo (Ginásio de Tavira). O Prémio da Montanha foi para Mário Silva (F. C. Porto).

Infelizmente, nesse mesmo dia, no regresso à Covilhã, um jovem covilhanense, José Filipe Carriço de Sousa, foi atropelado por um automóvel, falecendo no local.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

*Informação telefónica obtida em 09/08/2025, junto do Clube Desportivo Águias de Alpiarça, por D. Jessica (Secretaria).

(In “O Olhanense”, de 01-09-2025)


4 de setembro de 2025

UM ARTIGO QUE NÃO GOSTARIA DE ESCREVER

 

Mais uma vez, a Covilhã veste-se de luto. Mais uma vez, um bombeiro não regressou ao quartel, à família, aos amigos. A tragédia aconteceu a caminho de um incêndio, tal como em cinco anteriores casos que narrei no meu livro Vida e Obra dos Bombeiros Voluntários da Covilhã.

Daqui se conclui que o perigo não está apenas nas chamas que consomem florestas e casas, mas também em cada quilómetro percorrido, em cada estrada, em cada instante em que se parte de farda vestida, com a missão de proteger e salvar.

Cada vez que a sirene ecoa na cidade, sabemos que há vidas em risco, que há património e memórias ameaçados. Mas, para os nossos bombeiros, cada toque da sirene é também um salto para o desconhecido. Partem sempre com coragem, conscientes de que podem não regressar. E quando não regressam, a dor espalha-se como um fogo que nenhuma água consegue apagar.

Muitos heróis integram já a longa história dos Bombeiros Voluntários da Covilhã (BVC), instituição gloriosa que completou recentemente 150 anos de existência, marcada por inúmeras ações de valentia no salvamento de pessoas e bens.

Foram já muitos os covilhanenses – de raiz ou de coração, da cidade ou das aldeias – que viram a sua vida ou património salvos pelos bombeiros. Outros, infelizmente, não puderam ser poupados à força devastadora dos incêndios que, ano após ano, assolam o país e deixam um rasto de prejuízos, alguns irreparáveis.

Com a morte trágica de mais um valoroso elemento dos nossos BVC, ocorrida no domingo, 17 de agosto, Daniel Bernardo Agrelo, de 44 anos, casado e pai de um filho menor de 14, totalizam-se já oito mártires ao serviço desta associação.

A primeira vítima – Abílio Adelino Sousa, fundador dos BVC – perdeu a vida num fatídico domingo, 18 de fevereiro de 1883, durante um exercício.

O segundo mártir – Sebastião dos Santos Júlio, altamente condecorado por atos de bravura – faleceu num acidente de viatura, numa 5ª feira a 10 de setembro de 1931, quando se deslocava para um incêndio. Tinha já salvo oito pessoas no incêndio da Mineira, na noite de 14-06-1907.

A terceira vítima – Mário Dias Tarouca – morreu na madrugada de 12 de abril de 1936 (domingo), cerca das 2 horas da manhã, em consequência de um desastre durante o incêndio da fábrica Manuel Lino Roseta.

As quarta, quinta e sexta vítimas mortais – António Miguel Vaz Marques, Ricardo Bruno de Jesus Cardona e Fernando Manuel Sousa Xistra, sucumbiram na sexta-feira, 2 de agosto de 1996, no trágico acidente aéreo do helicóptero que combatia incêndios florestais na Covilhã.

No feriado de 15 de agosto de 2013 (quinta-feira), a Covilhã perdeu mais um bombeiro, Pedro Miguel de Jesus Rodrigues, apanhado pelas chamas no sul do concelho, sem conseguir fugir.

O país continua a arder, ano após ano. Continuamos a assistir ao flagelo que destrói não apenas árvores, mas aldeias, lares, sonhos e, tantas vezes, vidas humanas. Até quando aceitaremos que este sofrimento faça parte do calendário de verão? Até quando permitiremos a floresta desordenada, a prevenção esquecida, e os nossos bombeiros lançados para a frente da batalha sem todas as condições que merecem?

A morte de um bombeiro não pode ser apenas notícia de um dia. Não pode ser apenas uma lágrima que cai e logo se seca. Honrar os nossos bombeiros é muito mais: é preservar a memória dos que tombaram, é cuidar dos que continuam vivos e ativos, é trabalhar para que estas tragédias sejam cada vez menos frequentes.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “Jornal do Fundão”, de 04-09-2025)


21 de agosto de 2025

PEDRO HISPANO


 

Foi o Papa João XXI, o único Papa português eleito. Uns chamaram-lhe sábio, pelos seus vastos conhecimentos científicos; outros “mago” ou “bruxo”, exatamente pelos mesmos motivos. A verdade é que Pedro Julião, de nascimento – Pedro Hispano, por alusão ao seu país – marcou profundamente o século XIII, deixando sinais indeléveis na história da religião, da filosofia e da ciência.

Nascido em Lisboa entre 1205 e 1226 (sendo esta última mais consensual), faleceu em 1277. Foi pontífice entre 29 de setembro de 1276 – eleito 12 dias antes, em Viterbo – e 16 de maio de 1277, data da sua morte. Uma vida relativamente curta (cerca de 51 anos), e um pontificado ainda mais breve (oito meses), mas ambos plenos de testemunhos relevantes.

Filho do médico Julião Rebolho, estudou na Universidade de Paris, tornando-se também um médico de renome, ao ponto de ensinar Medicina na Universidade de Siena (Itália) e de ser nomeado “arquiatra” (médico pessoal) do Papa Gregório X. Neste domínio, escreveu duas obras fundamentais: De oculo, uma tradução de oftalmologia, e, sobretudo, o Thesaurus Pauperum, no qual indicava curas adequadas para vários tipos de doenças, especialmente destinadas àqueles sem meios para pagar cuidados médicos. Entre os seus escritos filosóficos, destaca-se a Sumulae logicales, onde expõe os princípios essenciais da lógica aristotélica.

No entanto, toda esta atividade científica incomodou os cronistas seus contemporâneos, que o retrataram como “mago”, ou “negromanticus”. Quando morreu tragicamente, vítima do desabamento de algumas salas do Palácio Papal, chegou-se mesmo a sugerir que o colapso teria sido causado por uma explosão resultante de misteriosas experiências que estaria a conduzir – uma acusação mais reveladora do preconceito do que da verdade. Os seus adversários simplesmente não concebiam que um bispo, e muito menos um Papa, pudesse dedicar-se com tanto empenho às ciências.

Abraçando a vida eclesiástica, tornou-se arcediago e depois decano da catedral de Lisboa (1261) e mais tarde, arcebispo de Braga (1273). Nesse mesmo ano, o Papa Gregório X nomeou-o cardeal-bispo de Frascati.

Os seus dotes de inteligência e bondade impressionaram o Colégio dos Cardeais (composto então por apenas dez membros), que, após a morte do Papa Adriano V, o elegeu como sucessor de São Pedro. Como Papa, João XXI distinguiu-se também como diplomata, destacando-se a reconciliação que conseguiu entre Afonso V de Castela e Filipe III de França, após tê-los ameaçado de excomunhão. Dante imortalizaria o seu nome no Canto XII da Divina Comédia, destinando-lhe a glória do Paraíso.

Como o DN noticiou, tratou-se de um ato de justiça, protagonizado pelo presidente da Câmara Municipal de Lisboa, João Soares (agnóstico assumido), que disponibilizou cerca de dois mil contos para a construção do novo sepulcro – feito em pedra de calcário lioz de Lisboa, com duas pilastras sobre as quais assenta a laje do túmulo original.

Em memória do único Papa que governou e morreu sem nunca se ausentar da cidade de Viterbo – onde fora eleito e que, durante quase um quarto de século, foi residência permanente dos pontífices e centro da cristandade – Lisboa e Viterbo ficaram mais “próximas”.

Muitos anos depois, os compatriotas de Pedro Hispano puderam, finalmente, recordá-lo num local digno do testemunho que nos deixou: o testemunho de um espírito eclético, de um homem que, antes de abraçar a vida eclesiástica, já se destacava na medicina do seu tempo.

Em 1855, o duque de Saldanha, então embaixador de Portugal junto da Santa Sé, mandou executar um novo sepulcro, mais digno, em mármore. Na lápide ficou gravado: “Aquele que foi o esplendor da nação portuguesa jaz fechado num túmulo augusto. A piedade de um Saldanha coloca-o num sepulcro mais digno, querendo honrar o pontificado e o compatriota”.

 Em cada lado da epígrafe foram colocadas duas figuras em mármore: à esquerda, representação da Lusitânia (Portugal); à direita, a Filosofia, na qual Pedro Hispano foi mestre para a posteridade, sobretudo pela obra Summulae logicales. O mausoléu viria a ser concluído a expensas da Santa Sé, após a morte do embaixador, e transferido, em 1886, para a Catedral de Viterbo, por decisão do Papa Leão XIII.

Diversas vicissitudes fizeram com que este segundo mausoléu ficasse encoberto numa capela lateral murada da catedral. Várias foram as tentativas – por parte de prelados italianos e portugueses – para conferir mais dignidade à memória de João XXI. Mas só no limiar do século XXI se faria plena justiça a este notável português.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Olhanense”, de 15-08-2025)


6 de agosto de 2025

HÁ 519 ANOS PARA ALÉM DA TAPROBANA



 

Hoje conhecida por Sri Lanka, esta ilha situada a sudeste do subcontinente indiano era anteriormente designada por Ceilão, nome que manteve até 1972. Em cingalês, o nome da ilha significa “leão”. Há mais de 500 anos, os portugueses chegaram a este território, iniciando uma longa e complexa relação histórica.

Quase todos os portugueses conhecem as primeiras estrofes do Canto I, de Os Lusíadas:

As armas e os barões assinalados

Que da ocidental praia lusitana,

Por mares nunca de antes navegados

Passaram ainda além da Taprobana.

Ora, Taprobana era a designação que Plínio, no século I d. C., dava à “Ilha dos Leões” e que os navegadores portugueses, ao ali chegarem em 1506, passaram a chamar Ceilão – uma corruptela de Sailan ou Seyllan, nomes usados por mercadores árabes, chineses e italianos da Idade Média.

Origens e primeiros povos

Os registos mais antigos da história do atual Sri Lanka datam do século VI a.C., quando o povo cingalês (ou sinhala) migrou da região de Bengala, na Índia. Antes disso, a ilha era habitada por Vedas, de origem provavelmente malaia, cujos descendentes ainda vivem na parte leste da ilha.

Chegada dos portugueses

Em 1506, oito anos após a chegada de Vasco da Gama, D. Lourenço de Almeida desembarcou no Ceilão, então conhecido como “ilha da canela”, iniciando uma presença portuguesa que duraria cerca de 150 anos. Estabeleceu contactos com o rei de Kotte e iniciou a construção de uma fortaleza. No entanto, o vice-rei D. Francisco de Almeida (1505-1509), pai de D. Lourenço, era contra uma política de conquistas que implicasse grandes recursos humanos e financeiros. Assim, em 1519, a influência portuguesa em Colombo era quase nula, obrigando-os a continuar a comprar a canela a mercadores muçulmanos no Malabar.

Em 1512, António Real aconselhou D. Manuel a investir mais no comércio com as Maldivas e o Ceilão. Mas só em 1518, já no final do vice-reinado de Lopo Soares de Albergaria (1515-1518), se construiu a Fortaleza de Colombo. Mesmo assim, os portugueses nunca conseguiram obrigar o rei de Kotte a pagar regularmente o tributo imposto: 400 bahares de canela e dez elefantes. (Bahar era uma medida de peso variável no comércio do Índico.)

Em 1521, a fortaleza portuguesa foi cercada e abandonada três anos depois. Os portugueses esperavam que o recuo acalmasse os conflitos e garantisse o fornecimento de canela às naus do Reino.  

Os três reinos

No século XVI, o Ceilão era estratégico nas rotas comerciais do Índico, mas politicamente fragmentado. A ilha estava dividida em três reinos:

·       Kotte, no sudoeste, controlava o comércio da canela e foi o primeiro a estabelecer relações com os portugueses.

·       Kandy, no centro, era “reino das montanhas”, que viria a tornar-se aliado e depois inimigo dos portugueses.

·       Jaffna, no norte, era culturalmente ligado ao império hindu de Vijayanagar. Este último é a origem das tensões entre os Tâmeis do Norte e os descendentes dos outros dois reinos, que culminaram na guerra civil do Sri Lanka, séculos depois.

A fragmentação agravou-se em 1521, com a divisão do reino de Kotte e a criação do reino de Sitawala. Este novo reino, apoiado por Calecute, rival dos portugueses, empreendeu uma política expansionista contra Kotte e os seus aliados lusos, conseguindo conquistar Kotte em 1565 e reduzir a presença portuguesa à zona de Colombo.

Conflitos e domínio

Apesar dos revezes, os portugueses beneficiaram da política pró-lusa do rei de Kandy, desde 1550. Essa aliança visava conter Sitawaka. No entanto, em 1587-88, Colombo foi cercada por Sitawaka, numa resposta à cedência do reino de Kotte à Coroa portuguesa. Após resistirem ao cerco, os portugueses iniciaram uma ofensiva que, em sete anos, lhes deu o domínio efetivo da ilha – embora ainda com fortes resistências.

Ao contrário de outras colónias, os portugueses em Ceilão procuraram um domínio territorial e não apenas comercial, tentando implantar uma estrutura colonial baseada na terra. Mas o “reino das montanhas”, Kandy, tornou-se o principal opositor à conquista total da ilha.

A queda

A oposição permanente entre portugueses e cingaleses de Kandy impediu uma conquista completa. Em 1617, foi assinado um tratado de paz: Kandy reconhecia a soberania portuguesa sobre Kotte e comprometia-se a não se aliar aos holandeses, que, desde 1602, rondavam a ilha. Em troca, Portugal reconhecia o poder do rei de Kandy. Mas a paz foi breve.

Entre 1638 e 1658, os holandeses conquistaram todas as posições portuguesas. A presença lusa passou a ser apenas uma memória – mas uma memória viva: centenas de palavras portuguesas (como calça, saia, copo) permanecem no cingalês, assim como apelidos como Sousa, Coutinho ou Pereira, ainda comuns na atualidade.

DADOS ATUAIS DO SRI LANKA

Nome oficial: República Democrática Socialista de Sri Lanka.

Capital: Sri Jayawardenapura-Kotte (desde 1982), subúrbio da antiga capital Colombo.

Superfície: de 66.000 Km2.

População (2023): 22.04 milhões.

Grupos étnicos (2002):

·       Cingaleses: 74%

·       Tamiles: 18%

Línguas oficiais: Cingalês e Tamil

Religiões (2001):

·       Budismo: 69,1%

·       Islamismo: 7,6%

·       Hinduísmo: 7,1%

·       Cristianismo: 6,2%

Moeda: Rupia cingalesa

Regime: Parlamentar

Chefe de Estado: Presidente da República, eleito por seis anos.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

Fontes: Clube do Colecionador - junho 2004; Wikipédia

 

(In “O Olhanense”, de 01-08-2025)

28 de julho de 2025

O CAMINHO DAS PALAVRAS: TESTEMUNHO DE UMA VIDA DE ESCRITA




 

Sempre gostei de escrever, influenciado pela vivência na antiga Biblioteca Municipal, junto ao Jardim, onde passei grande parte da minha meninice e adolescência. Era aí que o meu Pai trabalhava, com a responsabilidade de abrir e encerrar a biblioteca, atender os leitores – procurando perceber o que pretendiam, numa época marcada por forte iliteracia –, entregar os livros e jornais solicitados, gerir o arquivo e desempenhar outras tarefas inerentes. Muitas vezes, substituía a primeira bibliotecária que conheci – a Drª. Maria José Borges, nos anos 50 do século passado. Mais tarde, surgiu a Drª. Maria Celeste de Moura.

As novas tecnologias nem se sonhavam. O ensino universitário existia apenas em Lisboa, Porto, Coimbra e Évora. Na Covilhã havia a Escola Industrial e Comercial Campos Melo, com cursos vocacionados para a indústria local e para os serviços comerciais, e o Liceu, que só mais tarde passou a ser Nacional. Quem pretendia seguir o ensino superior precisava de ter os bolsos bem recheadas para se poder estudar fora. Existia ainda o Colégio Moderno, que permitia prosseguir os estudos até ao antigo 7º ano, enquanto o Liceu e a Escola Industrial apenas iam até ao 5º ano ou equivalente.

O meu Pai, que fora anteriormente professor primário, ensinou-me a ler e escrever. Quando entrei para a Primária, no Asilo, fui diretamente para a 2ª classe. Terminei a 4ª classe (então o último grau obrigatório de escolaridade) e fiz o exame de admissão ao ensino secundário, na Escola Industrial, onde fui aprovado. Iniciei o Ciclo Preparatório e concluí o Curso Geral do Comércio e o Exame de Aptidão Profissional.

Os meus pais tiveram uma família numerosa, como era comum à época. As dificuldades económicas eram enormes. Desconhecíamos o que era ter férias e as algibeiras andavam sempre vazias – nem se sonhava com uma semanada. Incuti no meu Pai a ideia de arranjar um emprego e estudar à noite. Assim sucedeu. Fiz um exame de transição e tive de estudar, sozinho e sob o calor do verão, o programa completo de História Geral e Pátria do 2.º ano, além de Francês – tudo num mês e meio. Tudo isto para não perder um ano, já que o curso noturno durava mais tempo.

Os jovens de hoje não imaginam estas dificuldades. Como se costuma dizer, comi o pão que o diabo amassou.

A minha paixão pela escrita nasceu do ensino do meu Pai, da vivência na biblioteca e da atenção que dedicava aos estudantes que por lá passavam e que hoje, com cursos superiores e já aposentados, recordo com estima. Também ali via figuras notáveis que conversavam com meu Pai, por quem tinham grande consideração. Ele foi professor do falecido Cónego José de Almeida Geraldes, antigo diretor do Notícias da Covilhã (NC), e do poeta, escritor e professor universitário Prof. Dr. Arnaldo Saraiva, além de dois padres jesuítas.  Tive professores de excelência a Português, que me ajudaram a desenvolver o gosto e a habilidade pela escrita – as minhas redações costumavam ter notas elevadas.

 Mesmo nas poucas horas vagas do serviço na biblioteca, o meu Pai lecionava cursos de Educação de Adultos e preparava alunos para os exames de admissão ao secundário. Foi-lhe criado, pela primeira vez, um curso de adultos na Cadeia Comarcã da Covilhã, onde foi o primeiro professor a lecionar.

Com 17 anos, já era administrativo na Câmara Municipal da Covilhã. Concorri mais tarde a outro cargo superior, tirei a nota mais alta e pouco depois chegou o Serviço Militar Obrigatório. Fui para Tavira, para o Curso de Sargentos Milicianos, acompanhado por colegas da Escola Industrial. Eram três que, infelizmente, já faleceram. Depois segui para Leiria, (RAL 4), onde fui colocado e formei outros soldados em datilografia – não havia computadores nem telemóveis.

A distância da Covilhã, da família e do namoro levou-me a pedir transferência para mais perto de casa.

Assim, rumei à Guarda (RI 12), “sem despesas para a Fazenda Nacional”, onde encontrei muitos covilhanenses, como o Eduardo Prata, o Nuno Rato, do Teixoso, o Bicho Nogueira e o José Marques Abrantes entre outros. Também se encontrava o António José Fazenda, já falecido, que tal como o Eduardo Prata, jogavam no Sporting Clube da Covilhã. Foi também aqui que escrevi o meu primeiro artigo fora da Covilhã, no boletim daquela unidade militar – Fronteiros da Beira.

Após 42 meses de vida militar regressei à Câmara Municipal. Mas, escrevendo para o Notícias da Covilhã, algumas críticas que fiz obrigaram-me a ser cauteloso, temendo a PIDE. Fui trabalhar para uma empresa no Soito, freguesia do concelho do Sabugal, e depois fui convidado a chefiar a área administrativa e comercial da Companhia Europeia de Seguros, nos distritos de Castelo Branco e Guarda. Mais tarde, tornei-me empresário no setor segurador, representando a Liberty Seguros e outras Seguradoras.

A escrita, porém, nunca me abandonou. Continuei a publicar em vários jornais regionais e nacionais pro bono. Até hoje já publiquei 890 crónicas. No âmbito da APAE Campos Melo - Associação de Antigos Professores, Alunos e Empregados da Escola Campos Melo – que ajudei a fundar – consegui que fosse promovida a homenagem aos antigos atletas, treinadores e dirigentes do Sporting Clube da Covilhã (SCC) que jogaram na Primeira Divisão.

Convidei a imprensa nacional, com destaque para o Record e A Bola, e entidades e instituições oficiais do desporto e, apesar das dificuldades financeiras da associação que representava como um dos dirigentes, o evento teve um grande sucesso. Estávamos no dia 28 de setembro de 1991. Assumi o compromisso de escrever o primeiro livro sobre a história do SCC, publicado em 1992.

A imprensa nacional deu destaque ao evento e aos livros que se seguiram. O Jornal O Jogo anunciou um dos meus livros, e o jornal espanhol El Adelanto, de 14 de agosto de 1993, também se referiu a outra obra minha.

Na altura, a ausência de tecnologias dificultava muito: escrevia à máquina e as tipografias ainda não estavam evoluídas. A cor das páginas implicava várias chapas. Hoje, tudo é mais simples e acessível.

Seguiram-se várias publicações, umas por iniciativa própria em datas comemorativas, outras a pedido de associações, coletividades e instituições. Fazia tudo pro bono. Foram centenas de horas de trabalho, conciliadas com a vida profissional, muitas vezes com grande desgaste mental, mas nunca desisti.

Depois dos três livros sobre o SCC (mais tarde surgiu um quarto), publiquei a história dos Bombeiros Voluntários da Covilhã, em dois volumes, a convite da Direção, onde eu era Vice-Presidente do Conselho Fiscal.

Mas o maior desafio foi aceitar o convite – feito apenas com um aperto de mão, no Restaurante Sangrinhal – para escrever a História dos Seguros em Portugal. Depois de alguma resistência, aceitei e produzi O Documento Antigo – Uma Outra Forma de Ver os Seguros, obra inédita que combina narrativa histórica, romance e antologia documental. Está presente em mais de 150 bibliotecas municipais, bem como em universidades e outras instituições.

Em 2022 publiquei os meus dois últimos livros: Da Montanha ao Vale, e Recordar é Viver – este baseado em textos iniciados a 2 de julho de 1967, há já 56 anos.

Dos 12 livros publicados, o primeiro foi apresentado há 33 anos (1992). O meu primeiro artigo surgiu há 61 (1964). Escrevi em mais de 30 periódicos regionais e nacionais.

Sinto orgulho em saber que que a minha ação cultural e escrita se encontram presentes em várias universidades e em mais de 150 bibliotecas municipais do país.

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmil.com

(In “Jornal Fórum Covilhã”, de 23-07-2025 – digital)

18 de julho de 2025

O DIA DO BIQUÍNI E OUTRAS DATAS BOMBÁSTICAS

 

Em pleno estio, a parte cognitiva traz-me alguma dose de preguiça. Daí que, por mero acaso, no dia 5 de julho, li algures que se tratava do Dia do Bikini. Penso mesmo que há um exagero nestas celebrações. Será que também existe o Dia do Sutiã, do Vestido, das Calças, das Cuecas, do Fato-Macaco, do Cinto e dos Suspensórios? Mais acertado seria o Dia do Cão, do Gato, da Galinha ou do Porco – também chamado suíno, cevado ou bácoro.

Entre a tristeza e a hilaridade, opto pela segunda. A história do biquíni remete ao seu lançamento em 5 de julho de 1946. Tinha eu acordado para este planeta havia menos de quatro meses. Ainda não podia dar-me ao prazer de apreciar como essa peça de vestuário revolucionava mentes – quem sabe, na imaginação de Eva no Jardim de Éden.

Pois bem, foi em França que tal aconteceu – e não no paraíso terrestre.  O primeiro modelo foi desenhado por Louis Réard nesse ano de 1946, embora só tenha ganhado popularidade nos anos 60.

O nome desta ousada invenção deriva de uma ilha do Pacífico – Bikinionde se realizavam testes nucleares. A intenção era clara: sugerir que esta pequena peça teria um efeito “bombástico” na sociedade.

E teve. A sociedade tentou resistir, até que atrizes ousadas começaram a usá-lo. Brigitte Bardot foi pioneira no filme E Deus Criou a Mulher.

Com o tempo, a peça popularizou-se e tornou-se ainda mais arrojada, até que, nos anos 80, uma modelo brasileira lançou o famoso “fio dental”.

No Dia do Biquíni, marcas e lojas aproveitam para lançar novos modelos e fazer promoções. Enquanto isso, as mulheres compram ou desfilam os seus prediletos, na praia, na piscina ou até mesmo no jardim desde que haja sol.

Segundo a Vogue, o fato de banho – ultra minimalista para a época – foi apresentado na piscina do Hotel Molitor, em Paris, no corpo da dançarina exótica Micheline Bernardini, do Casino de Paris, a única que aceitou usá-lo. Com o slogan “O Bikini, a primeira bomba anatómica”, rapidamente começou a ser comercializado e a conquistar fãs entre as figuras públicas.

Em 1953, durante o Festival de Cinema de Cannes, a jovem Brigitte Bardot, com apenas 18 anos, atraiu todos os olhares – não na passadeira vermelha, mas na praia, com um biquíni reduzido e florido. Relembrava o papel que havia interpretado no filme Manina, the Girl in the Bikini (1952), de Willy Rozier.

Proibido inicialmente em diversas praias europeias, o biquíni foi ganhando popularidade graças às revistas de moda, imagens de pin-ups, e ao impulso da música e do cinema. Foi o caso de Ursula Andress emergindo das águas em James Bond 007 vs Dr. No (1962), Sue Lyon deitada na relva em Lolita (1962), ou Raquel Welch com o seu biquíni de padrão animal em One Million Years BC (1966).

Em 1968, o movimento feminista francês contribuiu decisivamente para a democratização da peça.

As tendências de moda demoravam a chegar até nós. Viam-se nas revistas, mas uma sociedade conservadora torcia o nariz às ousadias dos estilistas franceses. A ideia de separar o já ousado fato de banho em duas peças surgiu em Paris, após a Segunda Guerra Mundial. Em maio de 1946, Louis Réard, gerente de uma loja de lingerie, anunciou “o mais reduzido fato de banho do mundo”. Quase em simultâneo, Jacques Heim apresentou um modelo ainda menor, mas tal era a ousadia que nem encontrou modelos dispostas a desfilá-lo. Recorreu, então, a artistas de cabaré de Pigalle, que comentaram: “Este fato de banho vai ser mais explosivo do que as bombas de Biquíni”.

Nos anos 50, o biquíni esteve proibido em diversos países. Por cá, era tema apenas de curiosidade jornalística. Mostrar o umbigo era impensável. As jovens mais atrevidas chegaram a ser multadas – quase excomungadas. Foi preciso a ousadia de algumas atrizes estrangeiras para mudar mentalidades.

Nunca vi freiras, judias ou muçulmanas de biquíni. Mas em duas viagens a Israel, observei muçulmanas a banharem-se vestidas no Mar Morto e judias a realizarem batismos no rio Jordão com túnicas próprias.

Na viragem da década, atrizes como Ava Gardner, Ursula Andress e Brigitte Bardot seduziram meio mundo com os seus biquínis.

Nos anos 60, os umbigos passaram a ver a luz do sol – o biquíni tornara-se símbolo do movimento pop.

Recordo um excerto de Eduardo Prado Coelho, num excelente artigo publicado no Público em 2004, intitulado O umbigo dos sonhos:

“As calças femininas descem vertiginosamente abaixo da cintura, deixando por vezes entrever uma peça mais íntima de roupa. Se se trata de figuras de grande elegância, o efeito da beleza é incontestável. Nos casos mais prudentes, há uma zona do corpo que ora aparece coberta, ora se descobre ousadamente”.

Na década seguinte, o biquíni já era vulgarizado. Poucos anos depois, surgiram o topless e o fio dental, prontos a provocar síncopes nas senhoras do tempo do fato de banho até aos joelhos.

Mas as modas não esperam – e até os mais conservadores acabam por se habituar.

Hoje, o biquíni já não é escândalo – é acessório, é símbolo, é liberdade. E embora a moda continue a girar, umas vezes recatando, outras ousando, este pequeno pedaço de tecido continua a lembrar-nos que, por vezes, basta muito pouco para mudar tudo.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Olhanense”, de 15-07-2025)


10 de julho de 2025

UM ATO DE JUSTIÇA

 

Falta um ano para as comemorações do centenário do Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes. Na véspera deste marco histórico, a persistência da Direção da Instituição permitiu que um ato de justiça fosse concretizado ainda antes da efeméride.

Assim, no dia 22 de junho de 2025, mais de meio século após o movimento revolucionário do 25 de Abril de 1974, o Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes inaugurou o Memorial aos Combatentes da Guerra do Ultramar da Covilhã.

Era inegável a importância da existência de um monumento autónomo que evocasse esse período marcante da nossa história.

O Memorial localiza-se junto ao Jardim Público, ao lado do Monumento ao Soldado Desconhecido. Era uma aspiração antiga do Núcleo da Covilhã. Segundo palavras do Presidente da Direção, João Azevedo, esta homenagem é “significativa, edificante, elogiosa”, além de representar “um reconhecimento do esforço” feito pelos antigos combatentes nas ex-colónias e pelas respetivas famílias.

São 48 os covilhanenses que tombaram na Guerra Colonial e que agora ficam perpetuados para a posteridade – tal como os que regressaram feridos ou continuam a sofrer de stress pós-traumático. É, portanto, essencial que se preserve a memória de todos os que foram enviados para África e para a Índia.

Esta homenagem é imprescindível para os covilhanenses – da cidade e do concelho. Foram homens valorosos que, no mais longo conflito armado da história recente de Portugal, combateram em três teatros de operações: Guiné, Angola e Moçambique. Viveram momentos profundamente dolorosos – eles e as suas famílias. Foi, sem dúvida, um dos períodos mais sombrios da nossa história.

Os nomes de quase meia centena de jovens do concelho da Covilhã, que morreram em combate entre 1961 e 1974, estão inscritos no Memorial. A obra representou um investimento municipal de 75 mil euros. O projeto arquitetónico é da autoria de António Saraiva e Francisco Oliveira, que utilizaram granito, mármore e aço corten, para simbolizar a dureza do tema.

De acordo com os autores, o grande pórtico em aço corten, com base triangular – formal e simbolicamente representando a Serra da Estrela –, domina o espaço. Na base sólida e geométrica do murete em granito amarelo estão quatro lápides – Angola, Guiné, Índia e Moçambique – em aço, com os nomes dos militares mortos inscritos por ordem alfabética, de acordo com as listas oficiais fornecidas pela Liga dos Combatentes da Covilhã.

“A frieza da geometria do monumento é quebrada com uma imponente coluna central em mármore, que simboliza a perenidade de Portugal e a sua continuidade através dos séculos”, afirmam os arquitetos. As lajes em granito e mármore no solo representam as marcas físicas e psíquicas que muitos trouxeram do conflito. Ao lado, erguem-se três mastros com as bandeiras de Portugal, da Covilhã e da Liga dos Combatentes.

“É importante para quem esteve na chamada Guerra do Ultramar, ter um monumento que evoque especificamente este período, um reconhecimento do nosso esforço”, afirmou João Azevedo.

O Presidente da Câmara, Vitor Pereira, declarou: “O município presta, em nome dos covilhanenses, uma homenagem aos nossos combatentes. Este monumento simboliza a gratidão e o profundo reconhecimento por tudo o que fizeram. Queremos homenagear os que estão entre nós, os que partiram e os que tombaram no campo de batalha”. E concluiu, considerando este gesto como um “ato de justiça” perante a dívida moral dos portugueses para com os muitos jovens que foram combater “na flor da idade”.

João Azevedo salientou ainda a “justiça desta homenagem aos antigos combatentes que continuam a ser esquecidos e negligenciados pelo Estado e pela sociedade”.

Durante a cerimónia de inauguração – marcada por toques militares e entrega de medalhas de campanha – foi também prestada homenagem póstuma a Carlos Ramos, porta-estandarte durante muitos anos, figura emblemática deste Núcleo, já evocada aquando do seu falecimento em edição anterior.

É confrangedor constatar que, em 13 anos, Portugal mobilizou mais de um milhão de militares para a Guerra do Ultramar, onde cerca de dez mil perderam a vida. Foram ainda causadas aproximadamente 120 mil vítimas entre feridos e deficientes físicos.

Fundado a 16 de fevereiro de 1926, o Núcleo da Covilhã da Liga dos Combatentes conta atualmente com cerca de novecentos associados. João Azevedo, o seu presidente, lidera esta instituição há mais de quatro décadas.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

(In “O Combatente da Estrela”, nº. 139, JUL/2025)


CONTE-NOS A SUA HISTÓRIA Armínio Robalo Gamas


 

Trago para este número d’O Combatente da Estrela uma figura recatada e amiga do seu amigo. Conheço-a há cerca de meio século, principalmente no âmbito das lides profissionais.

Depois de me dedicar intensamente à escrita – que iniciei há seis décadas – vim a saber que o referenciado também é um antigo combatente das guerras do Ultramar. Daí o convite, que gentilmente aceitou, para narrar algo da sua passagem por terras de Angola.

Armínio Gamas nasceu no dia 28 de junho de 1946, no Vale da Senhora da Póvoa, concelho de Penamacor, mas foi na Covilhã que encontrou o seu primeiro emprego, na indústria de lanifícios, na fábrica de Joaquim Pereira Espiga.

É casado, tem dois filhos, quatro netos e um bisneto.

O início do serviço militar obrigatório ocorreu no CICA 4, no dia 20 de fevereiro de 1967. Foi depois transferido para o R.C. 6, no Porto, em 23 de abril do mesmo ano, seguindo posteriormente para a R.A.A.F. em 10 de junho.

Como se depreende, a sua especialidade foi a de condutor.

A mobilização para Angola surgiu rapidamente, tendo embarcado em Lisboa a 30 de agosto de 1967, no navio Vera Cruz, e desembarcado em Luanda a 14 de setembro do mesmo ano.

Em Luanda esteve três dias no quartel do Grafanil. Seguiu depois de embarcação até Noqui, onde permaneceu até ao seu regresso à Metrópole, em 9 de setembro de 1969, também no Vera Cruz.

Armínio Gamas informo-nos que, para além de várias trocas de tiros, a companhia não teve muitos problemas, excetuando-se uma morte em combate na CCS.

Questionado sobre se encontrou por lá alguém da Covilhã, respondeu-nos que estiveram com ele alguns conhecidos do concelho, entre os quais Carlos Venâncio, do Tortosendo, que pertenceu à sua companhia e se encontrava na mesma caserna.

Pois bem, o Carlos Meireles Venâncio, do Tortosendo, foi meu colega na Escola Industrial e Comercial Campos Melo da Covilhã.

Entretanto, Armínio Robalo Gamas, depois de regressar de Angola e cumprir o serviço militar obrigatório, retomou a sua atividade profissional na Covilhã, agora através da Praça de Táxis. Terminou a sua carreira como motorista de longo curso na empresa covilhanense Águias, Neves & Couto.

J. J. Nunes - Covilhã


(In "O Combatente da Estrela", nº. 139 - JUL/2025)


3 de julho de 2025

MIGUEL ESTEVES CARDOSO RECORDA O SEMANÁRIO “O JORNAL”


 

Sou um leitor assíduo das crónicas diárias deste escritor no Público. Por vezes, por falta de  tempo, algumas escapam-me na diagonal, mas as de MEC, por serem de leitura tentadora, interessante e dotadas de um grande poder de síntese, são, para mim, de leitura obrigatória – e sempre um grande prazer.

Já lá vai o tempo em que comprava sempre o semanário O Jornal e o diário Público em papel, deixando para segundo plano o Diário de Notícias. Com a chegada da pandemia, O Jornal desapareceu e passei a assinar O Público, pela via digital.

Há mais de 60 anos que continuo a escrever em alguns periódicos, pro bono. Por vezes, surge a dificuldade de falta de assunto – como aconteceu desta vez – já que remeti artigos para dois deles e tenho uma cirurgia marcada para o dia 1 de julho.

Veio a propósito a crónica de MEC, publicada a 9 de maio, sob o título “Vai um meio-século?”, onde recordava a sua escrita em O Jornal, há 50 anos. Transportou-me para memórias de quem por lá escrevia e de alguns dos seus diretores. Lembrei-me também de facetas menos positivas da chefia da empresa que representava, a qual, nos tempos do cavaquismo, via com desconfiança tudo o que pudesse ter uma conotação política. Assim aconteceu comigo, por estar associado a O Jornal, identificado como um periódico de esquerda moderada e democrática, com uma linha editorial crítica, independente e progressista. Destacou-se, sobretudo nos anos de 1980, pelo seu jornalismo de investigação, por colaboradores intelectuais de peso e pela sua independência face aos principais partidos políticos, apesar de alguma proximidade editorial com setores mais à esquerda.

O primeiro número foi publicado em 16 de março de 1975, poucos meses após o 25 de Abril de 1974, num contexto de intensa agitação política e grande pluralismo na imprensa portuguesa.

O seu fundador e primeiro diretor foi o jornalista José Carlos Vasconcelos. O último número de O Jornal foi publicado em 1992. Certo é que, nos seus últimos anos, atravessou várias dificuldades financeiras e mudanças de propriedade. O seu último diretor foi José Manuel Barata-Feyo, tendo também passado pela direção figuras como Mário Mesquita e Joaquim Vieira.

Apreciava bastante a página onde escrevia o escritor, romancista e cronista Augusto Abelaira – “Escrever na Água” – com o seu estilo irónico, lúcido e crítico, que tanto prestígio deu ao jornal.

Outros escritores, intelectuais e cronistas de O Jornal incluíam:

- Eduardo Prado Coelho - Ensaísta e crítico literário, colaborava com textos de análise cultural e política.

- António Mega Ferreira – Jornalista e escritor, mais tarde ligado à Expo 98.

- José Carlos Vasconcelos – Já referido acima, também advogado e poeta.

- Helena Vaz da Silva – Jornalista e mulher da cultura, escrevia com enfoque cultural e patrimonial.

- Fernando Assis Pacheco – Jornalista e poeta, conhecido pelo humor e estilo irreverente.

- João Bérard da Costa – Crítico de cinema e ensaísta.

- Maria Augusta Palla – Jornalista e ativista, escreveu sobre temas sociais e direitos das mulheres.

- Fernando Dacosta – Jornalista e escritor, autor de crónicas e textos de fundo.

Como diz Miguel Esteves Cardoso: “Digam o que disserem, não há nada como ser publicado. Fica-se com a sensação de existir”.

Para terminar esta crónica, quero recordar um caso paradigmático ocorrido no dia 18 de junho, na Clínica da Luz, na Covilhã. Aguardava a minha vez de ser chamado quando alguém, que não reconheci de imediato, se aproximou e me perguntou se o não conhecia. Estava, de facto, muito diferente (ele também só me reconheceu quando ouviu o meu nome). Perante a minha perplexidade, recordou-me um livro que publiquei e no qual surgia como líder do Sporting da Covilhã, assim como uma notícia sobre o mesmo publicada no jornal El Adelanto, de Salamanca. Foi então que nos abraçámos, passados mais de 30 anos. Era Manuel Matias Vaz, que se encontrava acompanhado pela filha.

 

João de Jesus Nunes

jjnunes6200@gmail.com

 

(In “O Olhanense”, de 01-07-2025)