À medida que se aproximam as
eleições autárquicas, o país enche-se de cartazes, slogans ambiciosos e
promessas renovadas – muitas vezes, apenas recicladas. Multiplicam-se
candidatos, todos convictos de possuir a chave para o desenvolvimento local.
Para uns, este é o momento maior
da democracia de proximidade; para outros, com natural ceticismo, não passa de
um desfile de rostos sorridentes e frases feitas, atrás dos quais se pode esconder
o mesmo enredo de sempre – um palco de vaidades e estratégias pessoais, onde os
eleitores acabam muitas vezes reduzidos a plateia, em vez de protagonistas.
Curioso é notar que alguns
autarcas, impossibilitados de renovar o mandato nos seus concelhos, optam por
se candidatar noutras paragens. A geografia política transforma-se, assim, num
tabuleiro de xadrez em que o essencial é não perder o lugar de topo. Trocam-se
freguesias por cidades, concelhos por vilas, mas permanece a ambição de se
manter na ribalta – quase como quem muda de camisola para não sair do jogo.
Não falta legitimidade a quem
deseja continuar a servir a causa pública. Contudo, esta “dança de cadeiras”
levanta questões inevitáveis: trata-se de vocação ou de carreira? De serviço ou
de poder? Em ano de eleições, o eleitorado, tantas vezes esquecido entre
mandatos, volta a ser cortejado. Entre promessas e discursos inflamados, cabe a
cada cidadão separar o trigo do joio, distinguindo quem de facto se compromete
com a sua terra de quem apenas procura mais um degrau na escalada política.
Entre mandatos, o povo é
frequentemente esquecido. Mas, quando chega setembro ou outubro, voltam todos a
bater-lhe à porta – com um sorriso ensaiado e a mão estendida.
Por isso, é ao a cidadão – o
único que detém, verdadeiramente, a chave da mudança – que cabe avaliar com
rigor quem se apresenta. É preciso olhar para além dos cartazes, ouvir para lá
das promessas e, sobretudo, perceber quem tem obra feita e quem vive apenas de
ambição.
A democracia sustenta-se em escolhas conscientes e informadas.
As autárquicas são um ato de confiança. Não nos deixemos enganar pela espuma dos
dias nem pelo marketing político. No fim, a força da democracia não reside nas
cadeiras que alguns disputam, mas na lucidez com que o povo escolhe quem nelas se
senta.
Que estas eleições sirvam, acima
de tudo, para reforçar a voz dos cidadãos – e não para alimentar vaidades ou
perpetuar jogos de poder mais do que alimentar vaidades ou perpetuar jogos de
poder. Porque o verdadeiro protagonista
deveria ser sempre o povo: aquele que, em silêncio, decide o rumo das suas
terras e confia, a cada quatro anos, que os eleitos honrem o peso do voto que
lhes foi dado.
João de Jesus Nunes
(In Jornal “Cinco Quinas”, Sabugal,
de outubro 2025)
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