27 de novembro de 2008

GRANDE LIVREIRO

A Covilhã sempre teve pessoas que à sua actividade comercial dedicaram toda uma vida, persistente e entusiástica, a par da prestação de serviços graciosos a organismos e instituições, noutras causas sublimes, servindo a cidade, o concelho, a região e até o País.
Numa dualidade de interesses – o profissional e o das causas públicas – fica a exemplaridade do empenho de muitos covilhanenses; de raiz ou de coração, até que a idade passou a doer; em muitas vertentes, acentuadas na cultural.
No contacto quotidiano com o público, ao balcão ou à secretária, referenciamos os já desaparecidos João Leitão (mercearias e café), Leandro Fonseca e José Soares Rocha (serviços farmacêuticos), Joaquim Gonçalves Carvalho e João Duarte (fazendas e retrosarias); e, em vida, dentre vários, destacamos Manuel Diniz (pronto-a-vestir e mobiliário).
No mundo dos livreiros, destacou-se na Covilhã José Mendes dos Santos, com mais de 60 anos desta actividade, uma figura de fino trato, dedicado, amável, simples, deixando assim muitos amigos, mormente no âmbito da cultura, na cidade laneira que o viu nascer, e que o mesmo a viu transformar-se em cidade universitária. Deixou-nos a semana transacta, aos 93 anos, mas irá permanecer a sua memória.
A extinta Livraria Nacional, fundada em 1958, de que foi proprietário, chegou a ser, sob a sua gestão e da esposa, D. Maria Luísa, a melhor livraria de toda a Beira Interior, durante muitos anos.
Tal como o proprietário, também a livraria deixou saudades. Foi o espaço de muita gente, não só de alunos e de professores, como de pessoas interessadas em procurar um livro temático, onde encontrava sempre a boa vontade e o sorriso de José Mendes dos Santos, e da D. Maria Luísa.
Foi também neste estabelecimento – Livraria Nacional – que o autor da “A Lã e a Neve” – escritor Ferreira de Castro – num sábado do mês de Outubro de 1968, na sua visita à Covilhã, onde foi carinhosamente acolhido, teve uma sessão de autógrafos dos seus livros.
José Mendes dos Santos, verdadeiramente interessado pela Covilhã, contribuiu também para a referência de conhecimentos sobre a sua história, na efeméride de datas que assinalam eventos importantes, e no âmbito biográfico de várias figuras.
Foi o coordenador da “Toponímia Covilhanense”, e autor da “Breve História Cronológica da Covilhã” e de “Escritores do Concelho da Covilhã”.
Muitas iniciativas do mundo literário tiveram o cunho da Livraria Nacional.
A Covilhã muito ficou a dever a esta figura ímpar, que nem a sua biografia quis deixar nos seus livros – tal a sua singeleza.

(In Jornal do Fundão de 27/11/2008)

20 de novembro de 2008

PROBO COVILHANENSE

No caminhar da vida, fui privilegiado com muitos mestres do saber que formaram a minha personalidade, de harmonia com os talentos de cada um, começando por meu pai – o meu primeiro professor –, divididos pelos períodos académico e de vida profissional.
Da Primária, no Asilo, ao Secundário, na Escola Industrial e Comercial Campos Melo, memorizo perto de meia centena de mestres do ensino, desde os professores Raul e Tendeiro, na primária, aos Drs. Castro Martins, Oliveira Dias, Carneiro, Fidelino, Duarte Simões, Mª Adelaide Maia, Maria Cerdeira, Maria Céu Proença, Edite Castro Martins, Irene Portela, Arquitecto Calais, entre outros que, por fastidioso, não enumero.
Alguns deles deixaram marcas profundas da sua influência, não só na formação dos seus pupilos, como também ao serviço da cidade, e até do País, mostrando a têmpera forte do guerreiro Viriato, nos tempos em que era difícil impor-se, com uma integridade de carácter, a que alguns já foi, ainda que tardiamente, feito jus às suas obras.
Orgulho-me de ter tido dois professores cujos nomes já se perpetuam em duas ruas na parte sul da cidade.
Mas não tive como mestre do ensino uma figura de alto gabarito, que desapareceu do mundo dos vivos no dia 4 de Novembro – o Dr. António dos Santos Taborda – que conheci na mesma instituição onde iniciei o Secundário, na época de 1958/59. A sensação foi a de que era um professor por quem os alunos tinham uma grande respeitabilidade.
Comecei a vê-lo envolvido na vida pública, e recordo, com grande interesse, uma célebre polémica, num periódico da Região, com uma outra figura de prestígio na cidade, o advogado Crespo de Carvalho, com posições antagónicas na vida portuguesa.
Várias intervenções suas na comunicação social eram sempre de grande interesse e oportunidade – aquelas que escaparam ao lápis azul da censura – mas, muito cedo, este Homem é abafado do ensino, por ser vertical e não ter tido receio de apoiar com grande entusiasmo a candidatura do general sem medo, à presidência da República.
Presidia eu à APAE Campos Melo, quando deliberámos fazer uma homenagem aos antigos professores e funcionários que exerceram funções na Escola Industrial até ao ano 1960, a qual se veio a realizar em 14/12/1996.
Nessa altura tive oportunidade de convidar, telefonicamente, o Dr. António dos Santos Taborda, que não pôde estar presente, e, num ambiente cordial, e alegre, perguntei-lhe: “Dr., ainda usa bigode?”, como era característico da sua imagem, tendo-me respondido afirmativamente, e a rir-se.
As suas crónicas eram de fino trato e ávidas de serem lidas. Na minha última publicação, que saiu a lume em 2 de Junho de 2007, na CMC, lá está o Dr. António Santos Taborda, numa das minhas pesquisas, que inseri em duas páginas sob o título “O Desporto de Antanho e o nosso Sporting”, com a devida referência ao seu autor.
Penso que esta figura não chegou a ter o mérito duma justa homenagem pela edilidade covilhanense, num contraste com outras menos marcantes, o que, a verificar-se, foi uma grande lacuna que pode, e deve, ser ressalvada com a atribuição do seu nome numa das ruas da cidade da Covilhã.

(In Notícias da Covilhã de 20/11/2008)

15 de novembro de 2008

SERRANOS E ALGARVIOS NA SENDA DAS MEMÓRIAS

É com grande satisfação que verifico que o Jornal Olhanense continua superiormente dirigido, inclusive numa renovação, onde não falta a mão do prezado amigo Mário Proença. Tenho feito referência, para as bandas de cá, sobre a qualidade e dinâmica deste órgão da comunicação social, que transcende para além do regional. Parabéns, pois, a todos os seus obreiros, onde se incluem muitos dos cronistas de excelência.
Satisfação também por ver que Herculano Valente continua presente, agora com a merecida honra de director honorário a título póstumo. Que Deus o tenha próximo de Si.
As “meninas dos nossos olhos” vão indo de vento em popa, não obstante alguns ventos e marés, mas em tempos de crise financeira mundial, vão fazendo jus ao seu estatuto de clubes históricos do futebol português.
Tanto serranos como algarvios, quando em crises; que por vezes grassam pelas veias dos que vestem as camisolas de riscas verde e brancas, na horizontal, ou pretas e vermelhas, na vertical; não se coadunam com as tradições destas velhas agremiações serrana e algarvia, como leio na extinta revista “Flama”, de 20/10/1950, em comentários generalizados sobre o comportamento das turmas da Primeira Divisão, onde ambos militavam, nessa época.
Recordo que o primeiro encontro entre os clubes covilhanense e olhanense, na divisão maior do futebol português, se verificou na época 1948/49, com o empate a uma bola, na Covilhã; e uma vitória do olhanense em casa, por 4-0. Depois iria manter-se a tradição, com o olhanense a não conseguir ganhar na Covilhã; e o SCC a não conseguir vencer em Olhão.
Para a Taça de Portugal, o 1.º encontro entre as duas turmas verificar-se-ia, na altura a duas mãos, na época de 1960/61, mantendo-se a mesma tradição atrás referida, mas, na sua generalidade a ser mais favorável para as hostes olhanenses. Aliás, só se verificariam mais duas oportunidades de confronto, exactamente nas épocas de 1974/1975 e 1995/96, com as vitórias repartidas pelos dois emblemas: os covilhanenses na década de 70; e os olhanenses na época de 90.
Gostaria de ver no vosso jornal uma equipa do Olhanense, da época 1961/62, com os atletas identificados, pois foi a turma que me recordo de ver jogar na Covilhã, na minha adolescência.
Ficarei feliz por ver permanecer nos lugares cimeiros as nossas duas “meninas de olhos”.

(In O Olhanense de 15/11/2008)

6 de novembro de 2008

SPORTING DA COVILHÃ NA SENDA DAS MEMÓRIAS



Clube histórico, que está atravessando um bom momento, descrevendo mais uma página interessante da sua vivência, orgulho das gentes beirãs, completou 60 anos (numa vida de 85) de ter efectuado o seu primeiro jogo na Primeira Divisão Nacional – hoje I Liga/Liga Sagres.
Foi em 19 de Setembro de 1948 que o Sp. Covilhã defrontou, no pelado Estádio Santos Pinto, o Boavista, e logo com uma vitória dos serranos por 4-0.
Recordemos as duas equipas:
SCC: - António José; Roqui e Leopoldo; Fonseca da Silva, Pedro Costa e Fialho; Livramento, Teixeira da Silva, Carlos Ferreira, Tomé e Noronha.
Boavista: - Mota; A. Caiado e Pereira; J. Caiado, Chaves e Garcia; Luzia, Alcino, Passos, Fernando Caiado e Barros.
Os golos foram marcados por Carlos Ferreira, Fialho, Fonseca da Silva e Tomé. Era treinador Janos Szabo.
Pensamos que quase todos os obreiros deste memorável jogo já terão desaparecido do mundo dos vivos, excepção feita ao valoroso Tomé, com 84 anos, com quem contactei telefonicamente, para a sua residência em Setúbal, enquanto redigia estas linhas.
Tomé e a esposa aproveitaram o ensejo para enviarem, por intermédio deste Jornal, saudações a todos os dirigentes, atletas e covilhanenses em geral, muitos dos quais ainda o recordam envergando a camisola do Sp. Covilhã. E o mesmo Tomé acabaria por frisar: “Tenho agora aí um conterrâneo, a treinar o SCC”.
Tomé foi dos jogadores do SCC que mais jogos efectuou, ao seu serviço, na 1.ª Divisão, 138 jogos – atrás de Martin, Carlos Ferreira, Hélder, António José, Amílcar Cavem e Couceiro – ; e que também mais golos marcou, 41 – atrás de Simonyi, Suarez, e Livramento.
Também um contacto telefónico para S. Paulo – Brasil, com um voto de rápido restabelecimento da enfermidade que preocupa o 3.º melhor marcador de todos os tempos da Taça de Portugal (a par de Iaúca, do Belenenses) – o valoroso antigo atleta serrano, Suarez.
Por último, a satisfação de verificar o grande entusiasmo e empenho com que o Miguel Saraiva quer trazer a lume, na sua oportunidade, um belíssimo trabalho inédito, em álbum, de equipas do Sporting da Covilhã, de todos os tempos.

(In Noticias da Covilhã de 06/11/2008)

23 de outubro de 2008

FUGITIVOS

Da interessante crónica do professor Arnaldo Saraiva, no JF, sobre os vários medos, transpôs-me o pensamento para o tema que reporto, em três divisões (como poderiam ser muitas mais), daqueles que, por uma ou outra razão (muitas razões, para muitos), seguiram o destino dum abandono, numa perspectiva de “retirada”.

A nossa memória pode abarcar uma quantidade quase infindável de acontecimentos, como tenham sido passagens da vida familiar, académica, social, profissional, militar.

As estórias, ao longo da nossa vida, fazem a nossa própria história, recheada de ledas ou tristes emoções.

E na nossa própria existência, como humanos, vamos encontrar, na fugida do tempo, uma quantidade de eventos, alguns duma interessante cronologia.

Há uns meses atrás, numa visita hospitalar a dois familiares que tínhamos doentes, no mesmo quarto, na rotina ininterrupta do tempo, encontrei o José Armando Soares, que viveu nos Penedos Altos, e está radicado em Lisboa. Há quatro décadas estivemos na mesma unidade militar, em Leiria. O tempo fugiu. Nunca mais nos vimos.

No primeiro grupo de “fugitivos” vamos registar todos quantos, em vida, ou já para além desta, são encontro de recordações: num abraço de amizade, quando do reencontro, que não quer dizer que seja exclusivamente pessoal; na permanente memória dos que por cá deixaram rastos marcantes da sua existência, em domínios tão comuns como diferentes, e que já cumpriram a sua missão neste planeta.

Num segundo grupo, considero os “oportunistas”, ou seja, todos aqueles que, duma forma ou doutra, evitaram mais responsabilidades, para o esfumar de rastos das suas acções profissionais, gestoras ou governativas, menos concebidas. São sobejamente do nosso conhecimento algumas figuras da política governativa do nosso País. Mas, duma forma paradoxal, alguns conseguiram, além fronteiras, ser dignos senhores da representatividade internacional em que souberam ser investidos.

No terceiro grupo, os “fugitivos do medo”, situando-se aqui todos os que fugiram, pelas mais diversas formas, à vida militar, e suas consequências, em tempo de guerra subversiva, como nós tivemos a guerra do Ultramar. Os que mais se salientam foram os artistas e os escritores, que, depois do mar ter acalmado, chegaram como heróis, pois “lutaram” com a enxada que abria regos nos seus livros, e nos seu cantares. Foram desertores, e não exilados como alguns foram forçados, depois de combaterem o “bom combate”, na sua Pátria-Mãe, contra os agressores do povo, correndo riscos e suportando sofrimentos.

Mas, a Liga dos Combatentes que integra fortemente os combatentes do Ultramar, no seu ideal patriótico e de carácter social, é uma potência das memórias, onde também se regista o sofrimento, dos verdadeiros combatentes, na linha da frente.

Há ainda outros fugitivos, como os do tipo Felgueiras; do fisco e da Segurança Social…

(In Notícias da Covilhã e Kaminhos de 23/10/2008)

18 de setembro de 2008

“HABITUEM-SE!”

Eduardo Cintra Torres tinha razão na sua crónica de 13 de Setembro, no “Público”, recordando a expressão de António Vitorino, do PS, na noite das eleições, ao dirigir-se aos jornalistas sobre a política comunicacional do PS e de Sócrates. Foi então o silêncio impenetrável ao não dar conhecimento dos homens e mulheres que iam conduzir os destinos de Portugal.
O terramoto que então iniciara de reformas profundas foi do agrado de muitos, se não da generalidade, face às assimetrias e injustiças que grassavam por todo o mapa continental e das regiões autónomas.
Habituem-se! – Surgiram então muitos ventos e marés, que passaram a ser furacões de 1 a 4 graus, agitando alguns mal habituados a um certo inconformismo por umas quantas benesses ameaçadas, já que contrastavam com o comum dos portugueses.
Habituem-se! – Quem já estava habituado a comer o pão que o diabo amassou, e não conseguindo fazer ouvir a sua voz, a sua única ira manifestava-se na renúncia ao direito cívico, engrossando o número das abstenções e não votantes. Ao ouvirem aquela palavra soltara-se um grito de esperança.
Mas, neste habituar, e agora volvidos três anos de governo, a decepção de quantos acolheram com agrado as reformas – reformas que se desejavam para que não houvesse filhos de Deus e filhos do diabo, ou filhos e enteados, mas tão só portugueses da mesma Terra-Mãe, embora com as suas diferenças – é também um terramoto que o próprio governo não consegue resolver.
Habituem-se, à (in) justiça que temos, onde os homens do aparelho jurídico não se entendem; a que os processos se eternizem e alguns prescrevam; a que deixem que alguns arguidos “gozem” com o Estado, seja com ou sem “sacos azuis”; a que os “casos” que começam a deitar bafio não se dissipem, e, depois, a que todos nós, cidadãos, paguemos a factura de altíssimas indemnizações, jamais vistas, após satisfeitas pelo Estado, fruto da justiça que (não) temos.
Habituem-se, porque “a política, tal como é exercida em Portugal, abandonou a ideia de espírito de missão, e tornou-se num generosíssimo meio de se governar a vidinha” – nisto concordamos plenamente com as palavras de Baptista-Bastos ao Jornal de Negócios. E “é duvidosa a melhoria anunciada nos resultados escolares, que só poderá ser confirmada por instrumentos fiáveis, como são os que são aplicados em inquéritos internacionais”, conforme refere Daniel Sampaio, na revista “Pública”, de 31 de Agosto.
Habituem-se, porque nos conselhos de ministros deste Governo do que se trata é de tudo menos da erradicação da pobreza de dois milhões de portugueses, de uma distribuição de riqueza mais igualitária e de interdição do trabalho precário.
Habituem-se ao retrato da recessão demográfica, num país que já não soe dizer-se à beira-mar plantado, com mais mortes que nascimentos, com um saldo negativo, pela primeira vez desde 1918, onde se faz a pergunta: onde estão os jovens? O envelhecimento de Portugal só pode ser atenuado pela imigração, com a Eurostat mais optimista do que o Governo português.
Habituem-se a que Portugal já não seja um país de brandos costumes: são os assaltos a bancos a aumentar; aos postos de abastecimento de combustíveis; carjackings e homejackings; pistoleiros por todo o lado.
Mas habituem-se, ainda, ao abuso dos Bancos, impondo condições e subterfúgios para enriquecerem os seus accionistas. Já se fala em cobrarem 1,50 euros para levantar dinheiro no Multibanco!!! Qualquer dia voltamos ao tempo do dinheiro debaixo do colchão.
Habituem-se ao “plágio” da Senhora líder da oposição, com o seu silêncio, lá botando, de quando em vez, algumas pedradas ao Governo, sem dicas alternativas, nesta crise de nervos, e nem com o baralhar e dar de novo se resolve a questão.
Por último, deixo a última habituação – neste “habituem-se!”, com direito a forte indignação – através da leitura da página 23 do “Correio da Manhã”, de 9 de Setembro, para uma reflexão do retrato deste País – “Pensões milionárias – Entre Janeiro e Outubro deste ano atribui-se 207 pensões de valor superior a quatro mil euros por mês”; para, no número seguinte, do mesmo diário, surgir na primeira página o verdadeiro e actual retrato social do País, com a fotografia dum general na reserva com a reforma por mês, de 5915 Euros, aos 62 anos. A contrastar na capa, a fotografia do Sr. José Almeida que vai trabalhar para França, para ganhar, nas vindimas, para a despesa escolar com os filhos. E, neste momento, as Forças Armada contam com 127 generais na reserva, que custam ao Orçamento do Estado oito milhões de euros por ano.
Eu, por mim, ainda não me habituei. Da outra vez, já íamos em 48 anos de “habituação” e eu, ainda jovem, já sentia a mesma comichão da Liberdade.

(In Notícias da Covilhã de 18/09/2008)

21 de agosto de 2008

O “QUERER-DIZER”

Umas brevíssimas férias. Suficientes para um descanso da mente, e do espírito. Importantes para a leitura mais atenta dos jornais, sem ser em diagonal. Até os desportivos tiveram lugar. Também altura propícia para devorar um livro, que, por esquecimento, não foi na bagagem. Veio mesmo a calhar – uma Feira do Livro – no aprazível local, e, como opção, uma obra de Eduardo Prado Coelho. As páginas apenas seriam interrompidas pela notícia do cachalote jovem que veio morrer à costa. Fotos para a posteridade.
E, nesta silly season, até ao momento de redigir esta crónica, não havia notícia de medalhas oriundas de Pequim para os “nossos”(veio a “prata” para Vanessa Fernandes, já depois do texto pronto); mas, isto de medalhas, de lata, dois “vencedores” indiscutíveis: para o ciclista Sérgio Paulinho, mesmo sem ter daqui saído, face à sua idiotice pela não participação e pelo timing do anúncio de ausência, em cima dos Jogos...; e para o lançador de peso, Marco Fortes, afirmando, após o seu insucesso, por ter participado de manhã, que, para ele, “de manhã só é bom na caminha”. Que foi então fazer a Pequim, para além de gastar o dinheiro dos contribuintes? Isto é mesmo uma risada.
De regresso à minha cidade, duas notícias, – uma de memorização – paradoxais.
O Martinho Marques recorda no JF o José Manuel Riscado Pereira Monteiro – o Zé Manel Riscado – do tempo da Escola Industrial, e das suas facetas no seio empresarial da Covilhã. O irmão, o João, foi meu colega de turma no Ciclo Preparatório. Moravam inicialmente na Rua Vasco da Gama, em frente à Creche do Menino Jesus. O Zé Manel Riscado era o mais velho e acabou o Curso Geral do Comércio mais cedo. Gostava de conversar. Certo dia dei-lhe conta que, no meu primeiro emprego, o Rui Mateus (aquele do “caso Melancia”, em Macau) ia lá semanalmente fazer umas traduções de inglês; O Zé Manel Riscado, interessado, informou-me que era esse trabalho que exercia no seu emprego, ou empregos.
Depois, volvido algum tempo, surge como um relâmpago, envolvido em empresas, algumas que, com ele, tiveram a sua génese, e que, para a época, foi estranho o rápido sucesso. Falava-se no envolvimento de personalidades, desde gerentes bancários a secretários de Estado. Quando a “coisa” começou a dar para o torto, vieram algumas notícias denunciadoras da situação estranha das suas empresas. Recordo no extinto semanário “Actualidades” (saía, salvo erro, aos sábados) a notícia de muitos telefones a serem atendidos pelo Zé Manel Riscado, no seu escritório, com grandes subterfúgios. A última vez que o vi foi de papillon, num Mercedes, conduzido pelo seu motorista, aquando da inauguração das instalações do Banco Borges & Irmão, na Covilhã. O seu problema talvez fosse, como alguém afirmou, que “o intelectual era aquele que pensava que aquilo que já tinha sido pensado não tinha sido ainda suficientemente pensado”.
De forma antagónica, uma outra personalidade – António dos Santos Lopes – surge actualmente no meio, com uma outra dinâmica empresarial, ponderada, granjeando assim, há muito, duma grande respeitabilidade face às suas origens de operário, sindicalista, das Minas da Panasqueira, e, actualmente, empresário de sucesso, sem contestação.
Na Madeira e no Brasil, a sua acção de grande empresário deu-lhe oportunidade de ver o seu trabalho compensado, para, não só na Covilhã, poder dar lugar, com a parte financeira conseguida, com inteligência, à aquisição de empresas que pretende revitalizar, na ajuda ao associativismo e à solidariedade.
A sua personalidade de Homem de uma seriedade e dinâmica incontestáveis, pessoa de bem, já o levaram a ser condecorado, por duas vezes, no Brasil; a ter o nome numa das ruas da sua Terra, que não é a Covilhã; a ser nomeado sócio benemérito do Sp. Covilhã; entre outras distinções que não quer informar.
Aos bombeiros covilhanenses ofereceu uma ambulância, e ao SCC a Sede que irá surgir na oportunidade.
Por isso, tenho que me socorrer duma das obras de Eduardo Prado Coelho, referindo assim que “não há correspondência entre o querer-dizer e o dizer. Ao querer-dizer deve corresponder um trabalho de manifestação e de expressão. E é neste intervalo que se introduzem todas as inadequações e derrapagens. Como se insinua numa canção de Marisa Monte, “eu não sei dizer/o que quer dizer/o que vou dizer”.
“O que quis dizer ao dizer o que disse” é tão só para que não haja comparações entre as duas personalidades – distantes no tempo – porquanto a primeira semeou o trigo e deixou ficar o joio, que se inseriu em si próprio; e, a segunda, pretende desde já afastar o joio da sua sementeira, como é agora o caso recente que se passa com a empresa Fiper e o calote do Estado.

In Notícias da Covilhã de 21/08/2008

24 de julho de 2008

RÉPLICA DA ESPADA DE NUN’ÁLVARES


Por duas vezes fiz referência, no espaço das minhas crónicas no Notícias da Covilhã, à colocação da réplica da espada de D. Nuno Álvares Pereira, há 47 anos, mais precisamente no dia 20 de Maio de 1961, aquando da passagem, pela Covilhã, das relíquias do Santo Condestável, no monumento de Nossa Senhora da Conceição.
Tive a felicidade de presenciar essas cerimónias que se transformaram numa festa, tendo havido iluminações especiais, alusivas a este evento, nalgumas ruas da cidade e no próprio edifício da Câmara Municipal, onde brilhava a imaginação duma grande figura covilhanense, o então Director Delegado dos Serviços Municipalizados, Alexandre Galvão Aibéo (podem recordar essas fotos, e outras, numa consulta ao II volume do livro “Vida e Obra dos Bombeiros Voluntários da Covilhã”, páginas 418 a 424).
Aquando da restauração do monumento, há já algum tempo, a réplica da espada foi retirada do local onde há quase meio século ali se encontrava inserida.
Na Feira das Freguesias, realizada no mês de Junho, no Pelourinho, no pavilhão da Junta de Freguesia da Conceição, viemos agora a encontrá-la, felizmente, à responsabilidade da Fraternidade Nun’Álvares, onde a mesma esteve exposta.
Foi fruto da insistência de elementos daquela Instituição que a espada veio a aparecer, quando já se encontrava num antiquário, segundo consta!
Sendo parte do património da Covilhã, não se compreende o motivo do seu desaparecimento, pelo que os covilhanenses merecem ser esclarecidos deste imbróglio.
Aqui fica o meu repto.

In Jornal do Fundão, Noticias da Covilhã e Kaminhos de 24/07/2008

O “PIPA D’AGUARDENTE”

Uma cidade com uma equipa do desporto-rei bem representativa da sua região – como é o caso da Covilhã – e singrando a um patamar onde se possam encontrar outros grupos com marca de índole nacional, são uma mais-valia para a vida comercial e no âmbito do turismo, da própria região.
Assim foi noutros tempos. Assim pensamos, e esperamos, que possa acontecer daqui por diante, face ao êxito conseguido pelo histórico Sporting da Covilhã.
Arrumada que foi a casa pela equipa directiva, com sacrifício, e com a colaboração forte duma figura já sobejamente conhecida da Covilhã, há que extrair as ilações do passado e preservar a boa vontade e empenho das pedras basilares que deram ensejo a esta fase de ascensão da colectividade serrana.
Divisões abaixo da Liga Vitalis nunca mais! Mas este grito de Ipiranga só pode ter sentido se existir o apoio incondicional de todos os amigos da Covilhã, do mais pequeno ao de maiores recursos.
O pobre operário de outrora sacrificava-se para descontar a sua quota nos seus míseros salários. E assistia ao futebol de Primeira Divisão.
A vida hoteleira da cidade, e da região, aumentava um pouco as suas receitas, em dia de futebol no Santos Pinto.
E os covilhanenses esqueciam um pouco as agruras da vida, em dia de “vamos à bola”.
Depois, lá dentro, no campo, era o vibrar dos golos, a tristeza dos reveses, o frenesi dos grandes jogos, os sentimentos que iam na alma dos covilhanenses.
Uns mais vibrantes que outros, quando há golo para os da casa, todos são amigos e saltam ou gritam em uníssono.
Quando os jogos eram no Santos Pinto, na então Primeira Divisão; e depois muitos anos pelos caminhos das II e III Divisões, de campo pelado, primeiro, e relvado depois – terminaria aquela Divisão, de melhores recordações, em 1961/62, para regressar, à Primeira, numa efémera passagem, por duas vezes, na década de 80 – procurava-se o melhor sítio para assistir ao jogo. O mais óbvio era ir para um plano elevado, no alinhamento da linha de meio campo, onde se ficava equidistante das balizas e se via tudo o que se passava no meio campo. Enquanto outros se dividiam pelas bancadas central e laterais. Havia outros grupos que preferiam estar atrás das balizas da equipa que apoiam e outros da do adversário, sendo que uns eram mais adeptos do futebol de ataque e outros dando mais valor à defesa. No entanto, uns achavam mais útil apoiar os nossos atacantes e perturbar o guardião alheio ou o contrário.
De permeio, quando as coisas não agradavam a contento, os insultos à mãe do árbitro, aos jogadores adversários, num denotar do impulso educacional que vai em cada um.
Se algumas tristezas, também a hilaridade, provocada por alguns habituais que no futebol descarregam as dificuldades da vida, ou dividem o humor entre os seus pares e por toda a assistência.
De alguns gritos castiços a algumas piadas do momento, assim decorria o futebol.
Ainda na última época ouvimos o “Espanhol” e sua comitiva, enquanto, de vez em quando se soltavam uns sopros estridentes da corneta do amigo de Valverde.
Outrora foram os gritos dos malogrados Carlos Xistra (pai) a apoiar o SCC, como também soltava forte, direccionada para o homem do apito, de barriga mais saliente, a voz do José Manuel Cabeças: “pareces uma “pipa d’aguardente”.
E, com mais uns copos no antes e no após intervalos dos jogos, vamos, desta vez, afinar as vozes, para a próxima época, e transcender num entusiasmo contagiante para que não deixemos fugir o pássaro que temos na mão, pois, de contrário, é mais difícil voltar a apanhá-lo.

In Notícias da Covilhã e Kaminhos de 24/07/2008

3 de julho de 2008

O VELHOTE DO BURRO

Chegaram os Santos Populares E, com eles, o tempo quente. Não conseguiram fazer o milagre de bloquearem os aumentos dos preços dos combustíveis.
E a crise agudizou-se. Mas isto de crise já é palavra vã. Dois países deste planeta permutaram a pobreza pela riqueza.
E nós, inseridos na UE, onde podíamos já estar na vanguarda de outros parceiros, temos estado a ver a banda passar.
Parece que os nossos líderes só são bons lá fora, mas não cá dentro. Os opositores, enquanto treinadores de bancada, vão fazendo contas como tratar da sua rica vidinha. Os que botam ordens do palanque, desta casa onde nos governam, também não conseguem disfarçar algumas névoas sobre uma palavra quase a ser dissipada dos dicionários – “credibilidade”.
A diferença abissal, salarial, entre um administrador e o trabalhador de nível mais baixo é, nalgumas instituições, um autêntico vexame para os restantes obreiros duma mesma causa. E não chegam os avisos de alerta de Cavaco Silva para estes disparates. Mas também lhe faltou a coragem para outras condutas que seriam oportunas.
E, alguns, parecendo uns santinhos, como vemos na comunicação social, senhores de fortunas enormíssimas, e pensões vitalícias cristiano-ronaldescas, nem se envergonham da afronta que fazem, já não digo aos pobres de Cristo, mas à classe média a caminho da pobreza.
É por isso que a “credibilidade”, nas palavras bonitas, nas promessas de fluência oratória, deu o tiro no pé.
E, com isto tudo, vão continuar a doer as mortes, a custar os incêndios, a atordoar os crimes, a entristecer as derrotas e a inquietar as dúvidas mais sombrias, enquanto alguns já tomaram como opção serem politicamente polivalentes – todos os partidos servem como beiral do melhor “emprego” de sempre.
O aumento dos combustíveis levou a estarmos um pouco mais perto de imaginarmos como seria o fim de um tempo a viver sem o automóvel. E nem sequer pensar na evolução que houve no aumento de quilómetros de auto-estrada, quando há duas décadas não chegavam aos três dígitos, até à nação de betão que hoje somos. Imaginar o carro parado à porta de casa e as auto-estradas vazias. E passarmos a utilizar de novo os transportes públicos e a deixar de contribuir para o aquecimento global.
Face ao novo-riquismo, se o automóvel fosse proibido, as grandes cidades entrariam em colapso. É que tudo funciona em função do veículo privado. E ainda não se encontrou o inventar uma cidade alternativa à cidade do automóvel.
Não consentimos olhar para trás, na memória de há 30 ou 40 anos, onde uma aparente tranquilidade não passava dum bolo polvilhado de carências, sacrifícios, vergonhas.
A história que segue vem na peugada das dificuldades emergentes, na altura, da vivência no conformismo em levar o sacrifício até ao fim.
O antigo industrial, Álvaro Paulo Rato, um daqueles homens de fibra, em que a palavra dita ainda fazia lei, deslocava-se na sua carrinha Peugeot 304, por uma das estradas da serra, quando deparou, mais à frente, com um homem acompanhando um burro, carregado de erva, e, a seu lado, seguia a mulher, com duas cestas de hortaliça. Quase que ocupavam metade da estrada. O condutor, Álvaro Paulo Rato, vê acenar o homem do burro, que, ao passar por ele, lhe pede para levar a mulher mais uns quilómetros à frente.
- “Entre para aí!”- disse para a mulher, já sem grande espanto do João Brás, que seguia com o seu patrão, e que conhecia a índole do velho Paulo Rato.
Aproveitando-se da bondade do condutor que parara, o velho, dono do burro, suplica ao senhor do Peugeot para também lhe levar as cestas carregadas de hortaliça.
Num ápice, peculiar de Álvaro Paulo Rato, diz ao velhote: “Meta lá as cestas, e, olhe, se quiser, meta também o burro!”
Lá seguiram viagem: o Álvaro Paulo Rato, o João, a mulher do homem do burro, e a tralha. Atrás ficou, satisfeito, no seu caminhar lento, o homem e o burro.
Com o desenfrear do aumento dos combustíveis, e na alternativa aos transportes públicos, não será a vez de ter que se substituir o combustível por erva e andar de burro?

(In Noticias da Covilhã e Kaminhos de 03/07/2008)

13 de junho de 2008

A AMIZADE É UMA FESTA




13 de Junho de 2008

Pelo 5.º Ano, em Dia de Santo António, o CEO da Liberty Seguros, Dr. José António de Sousa, visita o Agente na Covilhã, João de Jesus Nunes

Como tudo há um princípio. Mas também é preciso haver sensibilidades. E ser dotado de uma especial inteligência. Sentir na fisionomia e nas expressões do interlocutor aquela dose de sinceridade, no fulgor expressivo do grito de Ipiranga.
Afinal nem todos os dias são proporcionadores destes actos.
Mas estávamos lá, naquele mês de Maio do ano da graça de 2003 – no Hotel Meridiam, em Lisboa, na apresentação do Administrador da Liberty – e no meio da maralha de ansiosos, alguns tão de curiosos como de medricas, tão desejosos dum líder quão da amálgama de interrogações de algumas mentes, eis que me senti envolvido na vontade indómita de dirigir uma palavra ao “Salvador da Pátria”, na esperança de lenitivo na resposta, que em três décadas não conseguia obter, para além de ver a banda passar, e nos meandros de alguns parceiros não olharem a meios para atingir fins.
E a confirmação da visita do 13 de Junho – que eu senti nas veias como um renovar de sangue novo – caiu na mente de alguns amigos parceiros estratégicos deste negócio, ainda a dúvida de S. Tomé, e, vai daí, no dia seguinte, a pergunta: “Então o Homem sempre aí foi?”
A história começa aqui com os pedaços daquela estória, sem mais parar, ficando perpetuada nas nossas memórias.
Mas no mar agitado da desenfreada concorrência, muita dela dotada de deslealdade, a qual jamais se havia visto neste mundo globalizado, temos tido sempre o atento Capitão a orientar a rota do destino, com chegada a bom porto, lançando muitas vezes setas certeiras aos monstros do mar.
E se a Amizade é mesmo uma Festa, do almoço da Senhora de Mércules, em Castelo Branco, do ano transacto, a idealização de uma reunião de empresários na Covilhã, que depois se transformaria num “Concurso de Ideias”, passando pelas universidades, na área do empreendorismo, aí está o “Troféu Liberty Seguros/Parkurbis – Criar 08”, que no dia 20 de Outubro, Feriado Municipal do Concelho da Covilhã, será o culminar de esta acção meritória, no contributo para a criação de emprego nesta região.
É, pois, com redobrado regozijo que este Dia de Santo António de 2008, a Agência da Covilhã da Liberty Seguros, com mais de um milhar de clientes e talvez a mais antiga do distrito de Castelo Branco, vai receber, de braços abertos, o Administrador da Liberty Seguros, Dr. José António de Sousa; o dinâmico Director Comercial, Dr. Rogério Bicho; o amigo de longa data, Gerente de Zona do Espaço de Leiria, Mário Marques, onde esta Agência já pertenceu; e os companheiros de jornada, do Espaço de Castelo Branco, Carlos Silva, Gerente de Zona; e Miguel Morgado Duarte, Gestor de Negócios.

29 de maio de 2008

PROFUSÃO DE EVENTOS

Corria o final do ano 1964. Numa das páginas do NC um pequeno texto meu. Era trabalhador e estudante. Dava assim início à minha participação escrita na imprensa.
Disseminou-se depois por outros órgãos regionais. O que ia escrevinhando chegou também a um regional algarvio, de cuja publicação – O Olhanense – tive conhecimento do falecimento súbito do seu Director, neste mês de Maio. Foi um bom amigo. Depois de breves passagens por alguns diários, também o orgulho de ver referências a uma minha publicação num diário de Salamanca.
Mas é para o Notícias da Covilhã que o Word do meu computador tem os caracteres mais aderentes pelo entusiasmo da escrita. E já vai no 95.º ano da sua vivência. Em prol da cidade e da região. Na defesa dos seus interesses. Na denúncia de algumas ervas daninhas que por vezes emergem em prejuízo desta Terra e das suas gentes. Em favor dos valores da vida. Portanto, a Covilhã muito deve a este órgão da comunicação social, o mais antigo da região, com assaz energia para chegar ao centenário.
Eventos citadinos acontecem com alguma regularidade e várias efemérides, de âmbito nacional ou mundial, são celebradas todos os anos, umas com mais intensidade que outras.
A “Bênção das Pastas” na Covilhã é já um fenómeno de atracção obrigatória de muita gente, arrastada numa corrente familiar e de amigos, com ponto de convergência no Monumento de Nossa Senhora da Conceição. Já faz parte do cartaz académico, não só da UBI, como da cidade. Este ano, cerca de 10000 pessoas terão estado naquele local, e nas suas envolventes. Fez lembrar vários acontecimentos de outrora que, naquele mesmo sítio, foi também o ponto aglutinador de gentes, oriundas de várias redondezas, e provenientes mormente do povo humilde.
Actualmente as pessoas puderam instalar-se nos espaços verdes do recinto e nos degraus do mesmo, com cadeirinhas, ou mesmo no chão, aproveitando algumas sombras de árvores; e com os muros de acesso ao monumento repletos de gente. O sol sorria com muito calor durante as cerimónias.
Outrora, em verdadeiras romarias, as pessoas sentavam-se em mantas de ourelos e cobertores, pelo matagal que se estendia ao monumento, onde os pinheiros abundavam e as suas sombras eram um lenitivo para as longas caminhadas. Vinham de todos os cantos da cidade e arredores. E das freguesias rurais mais próximas. Outros, porém, vinham nas carreiras da Auto-Tranportes do José Nunes Correia. Traziam o farnel ou merendas nas alcofas e cabazes de verga, chegando bem cedo para tomar um lugar aprazível e de uma sombra. Ocupado o seu espaço, logo algumas mulheres, e não só, aproveitavam para descalçar os sapatos que faziam bolhas de água nos pés. Assim foram os acontecimentos do Grande Congresso Mariano da Diocese da Guarda, em 26 de Maio de 1954 (com cerca de 50.000 pessoas no encerramento, diziam as notícias da época); as Festas Comemorativas do Centenário de Lourdes, de 27 a 29 de Junho de 1958, com a participação do Núncio Apostólico, Cardeal D. Fernando Cento, italiano, (20.000 pessoas, diziam); e em 20 de Maio de 1961, a romagem ao monumento aquando da apoteótica recepção das Relíquias do Santo Condestável, com a entrega e colocação no monumento de uma réplica da espada de D. Nuno Álvares Pereira.
“Maio de 68” é uma data que fica eternizada para a história do mundo ocidental com a revolta dos estudantes franceses aos quais se vieram a juntar os operários. Foi uma autêntica machadada nos governantes franceses, com o Presidente De Gaulle e o Primeiro-Ministro Georges Pompidou a serem como que apanhados de surpresa. E da revolta, que ia engrossando a aderência de manifestantes, dos milhares para os milhões, numa paralisia global do país, surgiram as expressões de “É proibido proibir” e “É obrigatório ter prazer”. O Maio de 68 foi o repensar de todas as formas de poder e das relações de autoridade, o ponto de ruptura com as normas sociais, sexuais e políticas que até aí vigoravam.
Não dei conta deste acontecimento porquanto me encontrava na recruta, em Tavira, sem ouvir notícias, e o tempo era pouco, quer para escrever à namorada e à família (era assim na altura, pois não havia telemóveis e os telefonemas não tinham as facilidades e a celeridade dos dias de hoje), quer para me preparar para não chumbar no curso de sargentos milicianos, para onde me enviaram por obrigação. E tinha receio da guerra colonial.
“O 25 de Abril” começa a ser tratado por alguns como mais um feriado, assim o fazem os canais privados, e a RTP a mostrar pela enésima vez o filme de Maria de Medeiros “Capitães de Abril”. Há que não cair na indiferença total de um lado nem no lugar-comum gasto do “Grândola Vila Morena” ou “E Depois do Adeus” do outro. As celebrações têm que evoluir com o tempo e não ficarem agarradas ao mesmo de sempre. E Cavaco Silva a pedir o fim da venda de ilusões na política, preocupado com o alheamento dos jovens sobre a democracia, muitos deles sem saber o significado desta efeméride.
Outros eventos ficam para trás, por falta de espaço: os “100 Anos do Regicídio”, os “50 Anos da Campanha Eleitoral de Humberto Delgado” cuja viúva completou agora 100 anos, os “200 Anos da Fuga de D. João VI e da Família Real para o Brasil”, os “400 Anos do Nascimento do Padre António Vieira”, os “90 Anos da Batalha de La Lys”, os “60 Anos do Estado de Israel”, entre outros. Muito mais gostaríamos de aqui referir porque celebrar é também fazer acontecer, e, por vezes, é preciso a coragem de ter coragem.


(In Noticias da Covilhã e Kaminhos de 29/05/2008)

30 de abril de 2008

SPORTING DA COVILHÃ – OU VAI OU RACHA!



Compreendemos as dificuldades no terreno, na peleja desportiva. Compreendemos as dificuldades de encontrar um “mister” canalizador, na técnica e na táctica, de um entusiasmo a incutir nos homens da bola: o fazer o golo, a garra para entrar com a bola pela baliza dentro, a pontaria, a calma para não ser desfeiteado, a eliminação da ansiedade, se é que ela existe nas hostes serranas.
Mas também sabemos, que, contrariamente a outras entidades patronais, a vossa, leões serranos, fazem o sacrifício de vos pagar os salários atempadamente.
Logo, pensamos nós, exigentes homens da bancada, pagadores de cotas ou de bilhetes, orgulhosos de publicidades exibidas nos campos relvados ou insultadores do trio do apito, ou dos vossos adversários; logo, dizíamos, pensamos que tendes o dever de dar um pouco mais do vosso esforço, demonstrativo de que a liderança não é coisa vã, é, antes, a excelência, o mérito do vosso querer e acreditar.
Como que numa tentativa de meter o bedelho no balneário, aí vai uma fotografia, no final do jogo com o Sporting da Covilhã, no Estádio da Luz, em 1961, onde os leões serranos foram empatar com o Benfica por 1-1. Até houve troca de camisolas. Caríssimos atletas do SCC, no jogo da 2.ª volta, no Estádio Santos Pinto, os valorosos leões serranos, como se pretende que também vós sejais este ano (atenção ao Olivais e Moscavide, na final!) bateram o Benfica por 2-1. Mas…atenção, para a Primeira Divisão regressaram volvidos 23 anos.
Há agora uma oportunidade de vos manterdes a viajar no apetecido comboio mas, para se conseguir a outra faceta desportiva, embora para o escalão menor que o de outrora, torna-se necessário não perder o outro comboio rápido, ganhando o lugar de primeira classe ao Olivais e Moscavide.


(In Notícias da Covilhã de 30/04/2008)

10 de abril de 2008

A MULHER NA SOCIEDADE COVILHANENSE

Eva, na génese, não resistiu à tentação da serpente. Ao longo da história da humanidade a mulher tem tido um papel de relevo na sociedade. A samaritana ou a Maria Madalena, de pendor bíblico. A sedutora Cleópatra, da história da antiguidade. As rainhas e princesas até aquelas que arrastaram atrás de si um mundo inteiro na sua acção, de grande amplitude, na solidariedade e na ajuda aos empobrecidos de muitos males. Cresceu muito no século XX, envolvendo-se fortemente na vida política, e venceu a condenação de fada do lar. Mas se continua a ser companheira fiel do homem, também é uma resistente, tenaz pela independência, na sociedade em que cada vez mais se envolve.
Mas a mulher muitas vezes também é maltratada na própria literatura moderna, sendo os horizontes direccionados na via única do sexo, pese embora tenha havido uma primeira mulher que foi geradora da profissão mais velha do mundo. Vemos a mulher no trabalho, na afabilidade familiar, na sua veia cultural, na dinâmica para a igualdade entre o género, e numa exemplaridade de casos, dignos de realce, nos pequenos nadas do quotidiano.
Como noutros lugares, que hoje já são mais ou menos cosmopolitas, também na Covilhã, a mulher caminha incansavelmente porque sabe que um dia pode ter que deixar de caminhar. Sorri com tudo e ri por nada. Tem uma luz própria que nada nem ninguém conseguem apagar.
Maria da Nazaré vende fruta – “Olha a bela da banana!” – na praça da Covilhã, há 62 anos, duma vida de 83; Rosa Borrega, de Aranhas (Penamacor) aos 87 ainda cuida da quinta e conduz o motocultivador.
A sogra do covilhanense de coração mas nado no norte – Fernando Pedrosa Gonçalves – deixou há pouco tempo o mundo dos vivos, lá para as bandas de Gondomar, aos 97 anos – “Era uma mulher extraordinária, pois deu à luz 15 filhos e criou 13, ainda vivos. De inteligência e viva perspicácia, manteve a lucidez até ao fim. Era uma senhora. Tinha sempre uma palavra amiga e um cházinho com biscoitos para o teu amigo. Nunca a considerei sogra mas sim mãe” – tendo sido uma mulher exemplar. Na vertente cultural, pensando na sua Covilhã, mas radicada alfacinha, Maria Ivone Vairinho vai presidindo à Associação Portuguesa de Poetas e a ter o reconhecimento dos lisboetas.
Nos espectáculos etnográficos do Rancho Folclórico da Boidobra, um punhado de mulheres, moças e crianças dão uma lição da memória viva dos tempos de outrora, em “Quadras, Danças e Outras Andanças”, numa sua recriação.
Ana Catarina Pereira, no seu livro editado o ano passado, informa-nos que nos últimos dez anos mais de 5.000 operários têxteis da Cova da Beira caíram no desemprego; e Adélia Mineiro, do Tortosendo, fala-nos, no seu livro, d“O Feminino nos Livros Únicos do Estado Novo”.
Da emigração aí temos a covilhanense, de Vales do Rio – Alda Pereira Lemaitre – a ganhar a Câmara de Noisy-le-Sec, perto de Paris, e Patrícia Nunes, do Barco, eleita na lista de esquerda para o Conselho Municipal, em Dax.
E se, no atrás referido, outrora 15 filhos eram um tormento mas mantinha-se a alegria de viver, hoje o tema natalidade emana numa preocupação, e filhos precisam-se, com Portugal a ser o sétimo país mais envelhecido do mundo.
De grandes mulheres que foram esposas de nossos conterrâneos, como o médico e activista republicano, Januário Barreto, de Aldeia do Souto, onde tem um busto, conta-se o nome da médica Carolina Beatriz Ângelo, natural da Guarda, que foi a primeira eleitora portuguesa, e que está associada à fundação das primeiras organizações de mulheres que, em Portugal, lutaram pelos seus direitos civis e políticos. Foi a única a exercer o direito de voto durante a I República, numa persistente batalha jurídica. Fundou a Associação de Propaganda Feminista, aproveitando-se do “lapso” de a lei não referir o género e, na sua condição de viúva do nosso conterrâneo, com filhos a seu cargo, e como médica, foi às urnas exercer o seu direito, em 1911. Um ano depois, a lei foi revista para “cidadãos do sexo masculino” e as mulheres em Portugal só puderam votar e ir às urnas depois do 25 de Abril.
No antes e depois deste evento, de grande importância para a vida democrática do país, muitas mulheres covilhanenses se evidenciarem, em vários domínios – bastantes no anonimato, como autênticas heroínas – sendo conhecidos nomes como Conceição Antunes, Ilda Catalão Espiga, Eduarda Serra, Maria José Alçada, Judite Fitas, Maria Ascensão Simões, Maria Alice Mangana Monteiro, Celeste Panarra, ou as jornalistas Daniela Santiago e Andreia Neves, dentre muitas outras.
Não podemos deixar de recordar a colaboração de excelência da mulher covilhanense no III Congresso da Liga dos Bombeiros Portugueses, realizado na Covilhã, em Julho de 1932. Numa das paredes exteriores do Quartel-Sede, podemos ver na réplica da 1.ª placa colocada pela LBP o seguinte: “Homenagem de reconhecimento à mulher da Covilhã”
Muito haveria a dizer da mulher, ao longo da sua existência, mas tal não cabe neste espaço. Como também da mulher portuguesa. E do seu contexto no mundo – o seu trabalho no âmbito do humanismo, da política, do meio artístico, da religiosidade; e o crime na mulher africana, com as mutilações genitais, e
a vida degradante a que é obrigada a mulher muçulmana, no âmbito da Sharia.

(In Noticias da Covilhã e Kaminhos de 10/04/2008)

20 de março de 2008

PALESTRA AOS CANINOS DA COVILHÃ



Várias vezes denunciei publicamente a imundice que vai pela cidade com a defecação de cães, onde vários passeios e escadarias, destinados aos transeuntes, são infestados de porcaria.
Cada vez há mais pessoas a passear os cãezinhos, com todo o direito que lhes assiste, mas nem a todos vemos as preocupações de andarem munidos de sacos e luvas para apanharem as fezes dos seus cães.
Destes animais, a vadiar pela cidade, tenho visto poucos, mas também nenhuma vigilância vejo de parte de quem de direito, que já deveria ter criado condições para uma cidade totalmente limpa, aplicando legislação coerciva direccionada aos infractores.
Nalgumas cidades do País as edilidades já tomaram posição no sentido de disciplinarem o passeio dos cães na via pública.
Precisamos duma instituição fiscalizadora – tipo ASAE – para constatar, e actuar, a favor da saúde pública.
É preciso ir mais longe? Subam as escadas de acesso à Escola do Rodrigo e logo verão o que por ali grassa, com tantas crianças a ter que se desviarem do serviço deixado pelos canídeos.
Há dias, junto à Igreja de S. Francisco, com um sol radioso, passou um grupo de cães – não sei se iam para algum plenário canino... – saquei do telemóvel e tirei-lhes esta fotografia. Pareceu-me que gostaram, e, vai desta, em tempo de comemorações do IV centenário do nascimento do Padre António Vieira, lembrei-me do seu Sermão de Santo António aos Peixes.
Inspirei-me então: e porque não dirigir uma palestra aos cães desta cidade? Assim aconteceu, e, sentando-se os ditos cujos na escadaria da fonte, aceitaram a deliberação ali tomada, por unanimidade: “se nada for feito por nós, canídeos e amigos do homem, para não acontecer como aquele que ficou com um espinho espetado no rabo, ao subir os muros para junto dumas silvas da Avenida 25 de Abril, a fim de não defecar no passeio, os nossos colegas de raça e todos os disponíveis, no dia 14 de Junho, data em que acontece o cinquentenário da inauguração dos Paços do Concelho da Covilhã – por sinal também a um sábado como no dia da inauguração – iremos fazer uma régia cagadela nas arcadas e escadarias da Câmara Municipal”.
Esta régia decisão foi inspirada nas comemorações do Regicídio e nos 200 anos da chegada dos fugitivos régios ao Brasil.
Com uma republicana tomada de posição, a Câmara Municipal poderá deliberar a favor da saúde pública, comemorar o cinquentenário, e evitar um régio trabalho de limpeza extraordinária nas suas proximidades, penso eu de que...

(In Notícias da Covilhã, Jornal do Fundão e O Interior de 20/03/2008)

21 de fevereiro de 2008

DESFOLHAR O MALMEQUER

Neste nosso lindo e querido País, mas de assimetrias abissais, vamos assistindo, cada dia que passa, a um vendaval de notícias – quais pétalas do malmequer – que passam de ledas a tristes, com menor escala no vice-versa, não causando já espanto ao comum dos cidadãos.
Há uns tempos atrás escrevemos uma crónica intitulada “O Polvo”, mas pensámos que nos dias que iam passando, com homens na governação que se propuseram, com coragem, baralhar bem as cartas, de forma que os trunfos fossem bem distribuídos, depressa começamos a ver debaixo da mesa a mão batoteira de alguns parceiros.
E, neste contexto, não encontramos mestre-de-cerimónias a quem recorrer. Quando a vontade indómita de algumas pessoas, conjugada com o querer de outras, se juntam num esforço para um contributo da causa nacional, no mundo do trabalho, e vemos a nossa justiça a não conseguir apagar a incredibilidade em que se envolveu, onde vamos parar?
Começa já a haver algum histerismo em vozes que se levantam. É necessário ter em conta as mesmas, não fazendo delas ouvidos surdos. É que continua vivo o polvo, cujas habilidades tentaculares brincam com a justiça, não obstante as mudanças na liderança das pessoas. A responsabilidade pelos que deixaram passar o tempo de instrução dos processos ou os levaram a ter que ser arquivados, por irregularidades, para alegria dos arguidos, deve a justiça, nesta injustiça, levar os causadores por essas irregularidades à sua incapacidade para a profissão, e, como tal, a serem algemados, em definitivo, pelos tentáculos do polvo.
Nem só nos estádios há o êxtase dos grandes eventos desportivos. Temos visto, recentemente, em parangonas nos jornais e nos noticiários televisivos, o badalar dos sete mil euros por dia que passará a ganhar Cristiano Ronaldo (dez milhões de euros por ano!), e, por cá, o mau exemplo salarial duns senhores da Banca portuguesa, quer nacional quer privada.
Dez milhões de euros de indemnização e trinta e cinco mil euros por mês, em 14 meses por ano, de reforma vitalícia, do Sr. Paulo Teixeira Pinto, é um grito de Ipiranga, na revolta de quem sofre e vê ainda distante a data para a sua magra reforma.
São estas diferenças colossais que sugam a seiva a este País.
Mas ainda há valores da vida. E exemplos de pessoas de grande espírito de ajuda. E outras que são a exemplaridade duma dinâmica de trabalho em equipa, proporcionadoras do progresso implícito na excelência da sua liderança, com o coração do tamanho do mundo.
Damos alguns exemplos, na espontaneidade da sucessão dos acontecimentos, e na convicção de que, afinal, não é preciso ganhar milhões para se aproveitarem os valores da vida
O contraste entre os funerais daquela cesteira, pobre mulher que faleceu cedo de doença oncológica, já lá vão uns anos, sempre acarinhada na sua pobreza e que gente anónima a socorria, e se condoía com o sacrifício da mulher, viúva e moura de trabalho para angariar meios de subsistência para si, filha e neta, mas que reconhecia quem lhe fazia bem, teve a Capela do Rodrigo repleta de assistência na cerimónia fúnebre. Pelo contrário, o funeral de um industrial desta praça, também há vários anos, conhecido pela sua avareza, endinheirado, teve no cemitério amigos e familiares a contarem-se pelos dedos.
E se por vezes também é preciso ter coragem ainda que enfrentando uma multidão de gentes, recordamos a atitude do autor destas linhas, há cinco anos, num conhecido hotel de Lisboa, na apresentação do novo CEO duma multinacional, que vinha duma grande experiência internacional, interpelando-o sobre as nossas preocupações, de como iria olhar para o interior, onde estamos inseridos. De imediato aceitou tal atrevimento e considerou-o um facto histórico, passando a vir confraternizar connosco, em ambiente familiar, todos os anos na Covilhã, em dia de Santo António.
A sua dinâmica foi de tal ordem que, em pouco tempo, conseguiu a notoriedade da empresa multinacional, recente em Portugal, e a conquista, em dois anos consecutivos, da Volta a Portugal em bicicleta.
No suplemento “Primeiro Emprego”, do “Correio da Manhã” de 8 de Fevereiro, duas páginas contam a excelência do seu currículo profissional, quase todo feito no estrangeiro, na liderança de multinacionais.
Por último, num almoço profissional, no Verão transacto, em Castelo Branco, encontrando-se ao nosso lado, falámos de empreendorismo. Logo uma ideia se formou – um concurso de ideias, geradoras duma empresa – para ajudar a Covilhã na criação de emprego. E com via pela universidade, e pernas para andar, com a dinâmica do CEO do Parkurbis e o excelente acolhimento do Presidente da edilidade, haverá condições para se passar das hipóteses à realidade, com divulgação na oportunidade.
E, sensíveis à solidariedade, lá estivemos na “Covilhã Solidária”, com um contributo para esta causa.

(In Notícias da Covilhã e Kaminhos de 21/02/2008)

24 de janeiro de 2008

SE BEM ME LEMBRO

Da crónica de Pinheiro da Fonseca, no J.F., sobre o semáforo manual na cidade, “aí por meados do século passado”, na R. Visconde da Coriscada, fez-me saltar para outras memórias, nas brumas do porvir.
Recordo-me também daquela rua tão estreita que não permitia o cruzamento de automóveis, com a configuração em cotovelo, tendo sido colocado um polícia sinaleiro, junto da Ourivesaria Nunes, que já não existe.
Aquando da vinda de Humberto Delgado à Covilhã, em campanha eleitoral para a presidência da República, com Arlindo Vicente a desistir em favor do general sem medo, na disputa com o cabeça de abóbora, o sinaleiro que se encontrava naquele local deixou o seu lugar, após a passagem do cortejo, para se juntar aos colegas, a fim de disciplinarem a ordem pública, já que o povo, emergindo do silenciamento imposto pela ditadura, se sentiu em festa juntando-se para apoiar a caravana da candidatura, até ao Pelourinho.
Estava na minha adolescência mas recordo que o povo acorreu para junto do monumento ao soldado desconhecido, onde se dizia que o general iria depor uma coroa de flores, e, em frente à antiga biblioteca municipal, o subchefe Costa, da PSP, sendo amável, encontrava-se no entanto amedrontado com as ovações ao general e ajuntamentos e pediu-me que chamasse o seu colega, junto da leitaria, para se deslocar com urgência para o local da manifestação.
Também ali entoei o hino nacional, levado pela maralha entusiástica de gente, com muitos medrosos pelo meio.
Eram outros tempos mais tranquilos, (não se podia, no entanto, dizer mal do António das botas, e do seu regime, excepto o “gaseado”...) embora não haja saudosismo da sua vivência. De terror pouco se conhecia e faziam-nos sentir num Portugal seguro. Viajar de noite, por essas estradas da província, cheias de curvas e estreitas, não havia receios de se poder parar à beira da estrada, fazer um chichi e ouvir os grilos a cantar pelos campos lavrados.
Germinavam no entanto, a cada momento, vozes descontentes pela vivência neste País, com aquilo que não passava da chapa ganha, chapa gasta, com os mais novos a abrir os olhos.
Correram os anos. Aproximava-se uma aurora mas também seguida de algumas penumbras.
Em 1971 já eu estava farto de tropa obrigatória e chegava o finalmente. O adeus ao Regimento de Infantaria da Guarda. Num sopro de alegria, vai de fintar a hierarquia militar. Um segredo aos três colaboradores directos, para marcar o meu último serviço na unidade militar: os dois soldados, da Guarda, e o 1.º cabo, de Lamego, sairam para a rua, em pontos estratégicos, com as botas engraxadas e os distintivos do fardamento a brilhar. Nos locais combinados (“O Caçador”, Cine-Teatro e Café do Bonfim), o meu ordenança, do Tortosendo, ficava surpreso quando lhe pedi para anotar os números mecanográficos dos ditos cujos: “O que é que vai fazer aos gajos?”
Sem saber do que se passava, só ficou dissipado das suas interrogações quando saiu a ordem de serviço: “Foram louvados os soldados fulano e sicrano, e o 1.º cabo beltrano, por terem sido abordados pela ronda desta Unidade, devidamente ataviados, numa apresentação que se evidenciam dos demais militares desta Unidade, sendo um exemplo a seguir”.
No final, dos três militares um “Felicidades, meu Furriel!”.
Poucos anos passados surge o dia da libertação dos portugueses, e, do confronto de ideias e de interesses, num devaneio de muitos de não olharem a meios para atingir fins, e no desrespeito pelas mentes de cada um, surgiu, muitas vezes, um paradoxo entre uma tranquilidade e determinadas agitações sociais.

(In Notícias da Covilhã e Kaminhos de 24/01/2008)